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A Biblioteca da Daniela

A Biblioteca da Daniela

https://img.bertrand.pt/images/wicked-fox-kat-cho/NDV8MjM5NTQ3MzJ8MTk5ODgzODB8MTYwMzQ5NDAwMDAwMHx3ZWJw/300x
 Bertrand;
Wook.

 

Wicked Fox é o primeiro livro de uma duologia de Fantasia Urbana/Paranormal jovem-adulta de Kat Cho. É inspirada na mitologia coreana, mais especificamente nas figuras de gumiho, goblin, e outras. 

Neste primeiro volume, Gu Miyoung, uma rapariga de 18 anos, tem um segredo: ela é uma gumiho, uma raposa com nove caudas que devora a energia de homens para poder sobreviver. Como são poucas as pessoas que acreditam nas velhas histórias atualmente e há muitos homens maus dos quais ninguém terá saudades, a moderna cidade de Seoul é o lugar perfeito para se esconder e caçar.

Mas depois de se alimentar numa lua cheia, Miyoung cruza-se com Jihoon, um rapaz humano que está a ser atacado por um goblin na floresta. Ela quebra as regras de sobrevivência para salvar o rapaz e acaba por perder a sua pérola de raposa, a sua alma de gumiho.

Jihoon sabe que Miyoung é mais do que uma rapariga bonita, pois viu as caudas dela na noite em que foi salvo por ela. A sua avó costumava contar-lhe histórias sobre gumihos e os seus poderes e o perigo que eram para os homens. Ele sente-se atraído por ela de qualquer forma.

Com forças mortíferas no fundo, Miyoung e Jihoon desenvolvem uma amizade ténue que acaba por ser algo mais. Mas quando um jovem shaman tenta reunir Miyoung à sua pérola, as consequências são desastrosas e reacendem uma contenda que existe há gerações.

Miyoung vê-se forçada a escolher entre a sua vida imortal e a vida de Jihoon.


Se gostas de kdramas, mitologias e Fantasia Urbana, este livro pode ser perfeito para ti. Tem imensos ingredientes em comum com muitas séries coreanas (relação amorosa, amizades interessantes, suspense, mistério, muitas emoções mistas) e a mistura de aspetos da mitologia coreana com o quotidiano normal faz-nos sentir como se tudo fosse real ou como se estivéssemos na história também. Nota-se a paixão e o carinho que a autora tem pela mitologia e pela cidade.

 

A maneira como a ação se desenrola, sem rodeios e com explicações simples e breves, torna a leitura prazerosa e viciante. Primeiro, temos as dificuldades pelas quais as personagens passam (Miyoung perde a sua pérola de gumiho e Jihoon não percebe como lidar com todo um mundo novo e está sempre perto dela). Depois, vemos relações amorosas e familiares a abrirem-se mais e a tornarem-se mais complexas, desde a ligação carinhosa entre Jihoon e a avó até à relação tempestuosa de Miyoung com a sua mãe, que é uma gumiho fria e calculista. À medida que nos aproximamos cada vez mais dos pontos altos da ação, ficamos cada vez mais fascinados e com o coração nas mãos. Há traições, mortes e desespero. O enredo termina com uma mensagem mista de esperança e de dor, sendo, portanto, uma das melhores montanhas-russas que já experienciei enquanto leitora.

 

An illustration of a Korean girl/gumiho (fox spirit) with long hair, tails behind her, with a bright full moon behind her.
Fanart de Miyoung feita por cw.

 

A escrita de Kat Cho é simples e encantadora, no sentido em que nos cativa facilmente, deixando-nos colados à história. Cho soube escolher as palavras certas e os momentos ideais para mostrar as personagens tal como elas são. Cho também soube manter o suspense e fazer os leitores sentir à flor da pele as mesmas emoções que as personagens sentiam. Nem todos os escritores são capazes de serem tão eficazes e talentosos relativamente à colocação do leitor na história, isto é, Cho fez um excelente trabalho em criar personagens credíveis que o leitor irá querer apoiar e um cenário encantador, misterioso e fascinante ao ponto de nós querermos ser transportados para dentro desse mesmo mundo.


As personagens, como indiquei acima, são realistas e um pouco diferentes em relação às personagens que estamos habituados a ver em romances Young Adult. Os defeitos são um grande destaque neste livro, mas são também um grande ponto forte desta história, pois tornam as personagens mais reais. Nem todas as personagens têm de ser perfeitas e capazes de resolver tudo num instante. Afinal, os seres humanos não são assim. As personagens de Wicked Fox são das mais realistas dos últimos livros YA que tenho lido. Miyoung é uma rapariga bonita e poderosa, mas também é teimosa e muito dona de si. Por ser rapariga, poderão dizer imediatamente que ela é complicada e má. No entanto, diriam o mesmo se Jihoon tivesse esses traços? Muitos leitores aceitam facilmente os bad boys, mas abominam personagens femininas como Miyoung. Por mim, adorei Miyoung. Precisamos de mais personagens femininas como ela. Assertivas, fortes e, sim, donas de si. Jihoon é o oposto dela, sendo mais adorável, simpático e brando, não tendo receio nenhum em mostrar a sua curiosidade em relação a Miyoung. Também acho que é raro vermos personagens masculinas mostrarem de forma decente e carinhosa e com respeito o que acham acerca das raparigas, ou seja, é bom também termos personagens como ele. Uma outra personagem surpreendente é a mãe de Miyoung, Yena. Como disse, é fria e calculista, mas não se pode dizer que é uma autêntica vilã. Há mais no coração dela. Já as amizades florescem neste livro, mas fortalecem e crescem no segundo livro, que li há pouco tempo.

 

Cartões de Jihoon, Miyoung e Yena feitos por Alexis Castellanos

 

Neste livro que lida com temas como a família, a confiança, a lealdade e a crença em nós próprios, podem esperar também por romance, ação, emoções fortes, quer negativas, quer positivas, e figuras míticas incríveis. Aconselho a leitura deste romance YA.



Classificação: 4.5/5 estrelas.



Para quem não se lembra, criei há uns tempos uma espécie de rubrica onde iria escrever opiniões mais pequenas de livros que não gostei tanto quanto queria ou sobre os quais não tenho muito a dizer. A rubrica chama-se Formigas Literárias precisamente devido ao tamanho das opiniões e baseia-se em poucos parágrafos curtos sobre dois ou três livros.


Na publicação de hoje, pretendo falar sobre Dias de Sangue e Glória, de Laini Taylor, Coraline, de Neil Gaiman, e Hollow City, de Ransom Riggs.

 


Em Dias de Sangue e Glória, acompanhamos Karou, que finalmente sabe quem foi e quem é. Depois de se ter apaixonado pelo inimigo e ter sido traída, acaba num castelo de areia onde irá tentar recriar o universo do seu passado e fazer regressar as quimeras. Mas não consegue esquecer-se de Akiva, que também não consegue deixar Karou ir.

Este é o segundo livro de uma trilogia de Fantasia, Daughter of Smoke and Bone. O primeiro livro foi uma leitura magnífica e que me deixou entusiasmada o tempo todo. Contudo, não posso dizer o mesmo quanto a este segundo volume. Foi uma leitura parada e monótona. Além disso, tínhamos mais do mesmo relativamente às personagens. Tem algumas partes interessantes, como os processos pelos quais Karou passa para realizar a sua magia. Fora isso, não foi tão estupendo e viciante como o primeiro. Apesar disso, o estilo de escrita continua impecável e poético, sendo um dos pontos fortes da autora.

 
3/5 estrelas
 
 
 
imagem
Sinopse original.

 
 
 
A seguir, temos Coraline, de Neil Gaiman. Coraline é um livro infantojuvenil, mas, nos últimos anos, tem sido lido principalmente por adultos. Tem como protagonista Coraline, uma menina que, um dia, decide investigar uma porta misteriosa da sua casa nova. É assim que ela descobre uma passagem secreta que tem como destino uma casa exatamente igual à sua, mas, ainda assim, também muito diferente.

No outro lado da porta, ela vê coisas muito estranhas, como anjos flutuantes, livros com imagens que se contorcem e pais que são exatamente como os seus! No início, eram simpáticos, mas, entretanto, revelam ser capazes de até aprisionar os verdadeiros pais de Coraline num espelho. Conseguirá ela salvá-los e regressar ao mundo real?


Li-o no outono de 2019 e, de facto, foi uma boa leitura outonal. Tem os seus traços estranhos e arrepiantes, sendo adequado para o Halloween. Gostei das mensagens do livro e da forma como elas foram exploradas neste livro. Vemos uma Coraline que deseja uma vida diferente, mas quando ela tem, de facto, uma vida diferente, ela pensa em voltar para a sua verdadeira vida e estar com a sua família verdadeira. Portanto, até que ponto os nossos desejos e sonhos poderão ser melhores do que a nossa realidade?
As ilustrações que acompanham a edição que tenho combinam bem com a história, pois são igualmente estranhas e têm uma aura assustadora.
A escrita do autor é simples e é ideal para o público mais jovem, sendo envolvente e simples.
Não tenho muito mais a dizer. Vi o filme primeiro, mas há muitos anos. Acho que este é um dos poucos casos em que o filme executou melhor a ideia do que o livro, que é o material original da ideia. Talvez seja por isso que não tenha gostado tanto do livro, embora tenha as suas qualidades. Recomendo este livro como uma leitura digna do Dia das Bruxas.

 
3.5/5 estrelas
 
 
 
Coraline
Edição que eu li.
Sinopse da edição portuguesa.


 
 
Hollow City, de Ransom Riggs, é o último livro desta edição de Formigas Literárias. É o segundo livro da coleção Crianças Peculiares da Senhora Peregrine. Se ainda não leram, pelo menos, o primeiro volume e têm interesse na sua leitura, será melhor não lerem esta opinião.

Jacob Portman queria encontrar respostas para a morte misteriosa do avô e foi assim que foi parar ao Lar da Senhora Peregrine para Crianças Peculiares. Todavia, lá, só encontrou mais mistérios, como um lar cheio de crianças com poderes sobrenaturais que estão à guarda da senhora Peregrine, que as protege das criaturas perigosas que parecem determinadas a exterminá-las.
O lar é destruído e a senhora Peregrine fica em perigo. Jacob, que descobriu que também tem poderes, junta-se aos seus novos amigos para tentarem salvá-la. Mas ele encontra-se numa Londres que vive na Segunda Guerra Mundial e as ruas não são nada seguras para crianças que se encontram sozinhas... Jacob e os amigos terão de enfrentar desafios inimagináveis para se salvarem.

É verdade que já li este livro há dois anos, mas, infelizmente, não me lembro nada sobre ele. Só sei que achei o primeiro livro melhor do que este. A atmosfera misteriosa e nublada do primeiro volume mantém-se neste livro, bem como o uso perfeito das fotografias vintage, fotografias essas que fazem com que a história tenha uma carga real, embora, claro, seja tudo fictício. Mas acho que não há mais nada que se tenha destacado ou que tenha sido completamente diferente do livro anterior. De qualquer forma, é também uma boa leitura outonal.

 
3/5 estrelas
 
 
https://img.bertrand.pt/images/cidade-sem-alma-ransom-riggs/NDV8MTYwNjcwMjh8MTE2MTIwOTR8MTQzNDA2MzYwMDAwMHx3ZWJw/502x
Sinopse original.
 
 
 
 
 
 
Por agora, é tudo. Até breve!
 
 
 
 
Edição australiana de The Ones We're Meant to Find.

 

Em primeiro lugar, quero deixar o meu agradecimento à Text Publishing (editora australiana) e à NetGalley (plataforma de eARCs) por me terem cedido gratuitamente um eARC deste livro. Isto, no entanto, não irá influenciar a minha opinião acerca desta leitura.


Em The Ones We're Meant to Find, de Joan He, duas irmãs, separadas pelo oceano, tentam reencontrar-se a todo o custo.
 
Cee acordou numa ilha abandonada há três anos e não sabe como lá chegou. Agora com 18 anos, ela vive numa cabana com um android e uma única memória: ela tem uma irmã e ela deve escapar para encontrá-la.

Na segurança da eco-city que flutua acima da Terra, agora dizimada por desastres naturais, Kasey, de 16 anos, faz o luto por Cee, que deve estar morta. Ela também quer escapar: a eco-city deveria ser um santuário para as pessoas que querem salvar o planeta, mas os seus habitantes são capazes de tudo para terem um refúgio, até mentir. Estará Kasey pronta para usar a tecnologia para ajudar a Terra, apesar de ter falhado a sua irmã?

Cee e Kasey pensam que se conhecem bem e que o seu mundo é verdadeiro. Ambas estão erradas.



Este livro de Ficção Científica YA é explosivo e cativante e é de uma inteligência tremenda. Abordando temas como o luto, o meio ambiente e a humanidade, este romance distópico irá agradar os fãs de Black Mirror e de ficção distópica no geral.


Em primeiro lugar, o enredo está muito bem conseguido. A primeira metade do livro pode ser um pouco mais lenta, principalmente por causa dos termos científicos e tecnológicos usados. Mas é uma boa base para tudo o que acontece na segunda metade, que é, sem dúvida alguma, a melhor parte do livro. Se a primeira metade foi como uma preparação para algo mais forte, a segunda metade ultrapassou as expetativas criadas nos primeiros capítulos. As reviravoltas não apareceram do nada. Aliás, quando elas acontecem, percebemos logo o porquê e como acontecem e a magia das reviravoltas está aí, ou seja, no facto de a autora ter deixado peças do puzzle pelo caminho de forma tão brilhante ao ponto de conseguirmos uma imagem final arrebatadora. Não há pontas soltas (a não ser o fim relativamente aberto, que é uma jogada inteligente, uma vez que nos faz pensar não só na história em si, mas também no estado do planeta e da humanidade) e não há nada no enredo que nos faça pensar que há demasiada palha. É um enredo forte e bem conseguido que nos faz refletir ao explorar a humanidade e os seus defeitos e qualidades, o meio ambiente e a relação que o ser humano tem com ele, as capacidades da tecnologia e até que ponto usamos o que criamos e se é usada para um bem geral ou para satisfazer desejos egoístas. Enfim, é todo um leque de reflexões e de sentimentos mistos. É, deste modo, um enredo sensacional.
 
 
 
Os dois cenários principais do livro.
Esquerda: a cabana de Cee.
Direita: a eco-city onde Kasey vive.
Artista: Eduardo Vagas.
 

 
A escrita de Joan He é brilhante. É interessante como a história tem tanto a ver com a ciência, a Natureza e a tecnologia, mas a escrita é muito humana e bela, tendo, por vezes, pinceladas poéticas e passagens muito bonitas. Engana-se aquele que pensa que a escrita de um livro de Ficção Científica deve ser mais direta e objetiva. Estamos, afinal, a falar de ficção de qualquer forma. Não haverá poesia e beleza na ciência e na tecnologia? He tem uma escrita muito bonita e cativante. A única coisa não tão boa é o uso extremo de termos técnicos e científicos na primeira metade do livro. Fiquei confusa muitas vezes, mas isso também pode dever-se ao facto de o inglês não ser a minha língua materna e, assim, sentia dificuldade em perceber certas passagens e palavras. De qualquer forma, é uma boa escrita e também dá para ver nisso através dos capítulos, que eram focados alternadamente numa perspetiva de uma das irmãs. Dava para ver claramente que um capítulo era de Cee e o outro era de Kasey. Desta forma, a autora soube adequar o seu estilo à maneira de ser de cada irmã.


As personagens são o ponto forte do livro. São mesmo o meio para atingir o fim do livro, ou seja, são as personagens que dão propósito e alma à história. Cee é divertida e sentimental, apesar de dar demasiado valor à opinião que os outros têm dela, enquanto Kasey é mais racional e objetiva, sentindo que não percebe as outras pessoas. São personagens muito complexas e ricas em traços positivos e negativos, tornando a história mais dinâmica. É com estas duas irmãs que podemos explorar, de formas diferentes, o que é ser-se humano, como pode a tecnologia ser nossa amiga ou inimiga, o que devemos fazer pelo planeta e como devemos encarar esta nossa casa que, todos os dias, é maltratada pelos seus próprios habitantes. Há, ainda, outros temas abordados através destas duas irmãs, como o amor, a amizade, o luto e a moralidade.
Outras personagens que, embora sejam secundárias, têm, também, o seu valor e contribuem para a narrativa e as questões levantadas pelo próprio livro são Hero e Actinium. Hero é um rapaz que, um dia, do nada, surge na ilha de Cee. Sem memórias e sem saber o que faz na ilha, Hero acaba por ser aquele através do qual refletimos sobre o que realmente nos torna humanos. Actinium é um jovem que Kasey conhece quando ela tenta seguir o rasto deixado pela irmã. É através dele que podemos pensar sobre a nossa própria moralidade. Se tivéssemos o poder e a inteligência para ajudar a Humanidade, mas também tivéssemos desejos sombrios próprios, que caminho seguiríamos?
As restantes personagens, que funcionam como ideias gerais, mostram o ser humano no seu melhor e no seu pior. Por um lado, vemos pessoas a fazerem o que podem para arranjarem soluções para problemas graves que afetam toda a população. Por outro lado, temos pessoas extremamente egoístas. E, ainda, temos aqueles que não veem esperança no fundo do túnel e, devido ao egoísmo dos anteriores, sofrem e acabam por ficar corrompidos ao ponto de magoarem outros para poderem salvar a sua própria pele. Tudo isto porque outras pessoas nunca quiseram resolver os problemas mais cedo ou, simplesmente, não queriam resolvê-los.



Personagens do livro.
Esquerda: Hero e Cee.
Centro: Cee e Kasey.
Direita: Kasey e Actinium.
Artista: Paulina Klime.




Em suma, The Ones We're Meant to Find pode ter um início um pouco lento, prejudicado principalmente pelo vocabulário técnico e científico, mas as reviravoltas estonteantes, as  personagens complexas e o enredo cativante são surpreendentes. É não só um livro que nos entretém, como também nos faz questionar sobre o estado atual do planeta e da Humanidade. Joan He é uma autora a seguir.


Classificação: 4.5/5 estrelas.
 
 
O livro será lançado amanhã, dia 4 de maio.
 
 
Avisos de gatilho: Doença terminal; suicídio; violência; morte; morte de parente (não na página); vómito; grande escala de desastres naturais e de baixas em massa; gore.
 
 
 
 
 
 

 



 
A Very Large Expanse of Sea, de Tahereh Mafi, é um romance YA contemporâneo sobre uma americana muçulmana que, um ano depois do 11 de Setembro, está cansada dos estereótipos contra os muçulmanos. Shirin tem 16 anos e já nem fica surpreendida perante a crueldade dos outros. Contudo, está cansada dos olhares rudes, dos comentários degradantes e da violência física que sofre devido à sua religião e por usar hijab todos os dias. Portanto, ela é muito reservada e recusa deixar as pessoas entrar, pois podem magoá-la. Ela deposita as suas frustrações na música e pratica break-dancing com o irmão.
Depois, conhece Ocean James. Ele é a primeira pessoa, desde há muito tempo, que realmente quer conhecer Shirin. Conseguirá ela baixar a guarda?



Este livro tem de tudo um pouco: raiva, amor, tristeza, alegria, ódio, revolta, esperança, etc. É uma leitura que nos leva a pensar como os estereótipos são extremamente tóxicos, sendo capazes de tornar a vida de alguém insuportável. É um livro carregado de mensagens sociais, políticas, culturais e religiosas. Mas é, sobretudo, uma história sobre Shirin, uma rapariga muçulmana que tenta viver a sua adolescência de acordo com os sonhos que quer alcançar, mas sem, infelizmente, esquecer a sociedade que a rodeia.

É, de certa forma, baseado na própria vida da autora, que é uma mulher iraniano-americana muçulmana que, tal como Shirin, pratica break-dancing e usa o hijab. Os Estados Unidos após o 11 de Setembro são o cenário do livro. A autora quis recordar o ambiente em que os muçulmanos viviam (e ainda vivem) devido a feitos que nem sequer deveriam levar a generalizações injustas e violentas: as pessoas maltratavam, temiam e desrespeitavam os muçulmanos devido aos ataques que ocorreram em 2001. Ainda hoje, sofrem esses preconceitos.

O estilo de escrita é simples, jovial e forte na forma como as emoções da protagonista são expostas. Para além dos sentimentos e das opiniões que Shirin tem relativamente à islamofobia, também vemos o surgimento e o desenvolvimento de uma paixão, a luta pelos sonhos, as preocupações pelos estudos, as vivências familiares, as amizades, etc. Tudo isto é feito de forma natural e cativante graças à escrita da autora.
 
 
 
Wallpaper da Epic Reads para telemóveis.
Fonte.

 
As personagens foram bem construídas e cada uma delas tem a sua própria personalidade, ou seja, não são homogéneas e as suas diferentes formas de pensar e de agir enriquecem o livro. Shirin é, sem dúvida alguma, a personagem mais interessante e mais marcante. A sua garra  faz-nos torcer por ela e os seus sentimentos também são sentidos por nós, leitores. Sentimos a sua raiva, a sua alegria, a sua tristeza, o seu cansaço perante um mundo que é injusto para com ela. Algo importante quanto a esta personagem é o facto de a sua identidade como muçulmana não ser a única coisa referida ou evidenciada. Shirin é, também, uma adolescente com os típicos problemas de um jovem da idade dela. Não esperem ver os estereótipos que Hollywood ama usar quando fazem filmes sobre muçulmanos. Esta história faz precisamente aquilo que Hollywood e os preconceituosos odeiam: mostram Shirin no seu todo e não apenas uma parte, a que corresponde à religião que pratica. É não só cansativo, mas também extremamente perigoso insistir constantemente nos mesmos retratos problemáticos e estáticos.
Depois, temos a família de Shirin, os colegas de turma, professores e, claro, Ocean, o primeiro amor de Shirin. Ocean, devido ao seu privilégio branco, não percebe tão bem as experiências de Shirin e as diferenças culturais que existem entre eles e não percebe ao ponto de sentir alguma frustração, se não estou em erro (li este livro há mais de um ano). Também vemos como a islamofobia afeta a restante família de Shirin, que continua a viver a sua vida e a praticar a sua religião independentemente das coisas que a sociedade diz e faz. Os colegas de turma e os professores representam aqueles que acreditam piamente nestes estereótipos horrorosos e agem como se Shirin fosse um perigo ambulante. Ou, então, querem usá-la como um instrumento educativo, como se Shirin existisse para ser estudada pelos coitadinhos brancos que sabem que não devem ser preconceituosos, mas que acham que devem forçar as pessoas marginalizadas a ensiná-los como ser melhores pessoas.



Concluindo, A Very Large Expanse of Sea é um livro arrebatador e repleto de sentimentos genuínos e fortes. O enredo pode não ser tão cheio de acontecimentos (na realidade, o livro é muito mais focado nas personagens em si do que na linha narrativa), mas a escrita de Mafi e o modo como criou as personagens, especialmete Shirin, tornam esta história mais rica e fascinante. É mais do que uma amostra daquilo que uma pessoa muçulmana realmente é, e não o que é de acordo com ideias negativas feitas por uma sociedade preconceituosa. É, principalmente, o retrato de uma adolescente muçulmana que passa por amores e desamores, adora várias coisas, como o break-dancing e a moda, e que só quer viver a sua vida.
 
Poderia e deveria ser publicado em Portugal.


Classificação: 4/5 estrelas.





Tenho opiniões de leituras de 2019 e, claro, de 2020 em atraso. Como alguns livros já caíram no esquecimento ou não me deixaram maravilhada, decidi que o melhor seria passar a escrever três ou quatro opiniões curtas numa única publicação. Portanto, sempre que virem o título "Formigas Literárias", já sabem que são opiniões não muito aprofundadas.


Vou começar pelo livro de Kristin Hannah, The Nightingale. Este livro de ficção histórica segue os passos de duas irmãs, Vianne e Isabelle, que vivem numa França invadida pelos alemães. Neste romance sobre a Segunda Guerra Mundial, temos as vivências daqueles que ficaram para trás, ou seja, aqueles que não foram lutar, mas ficaram nas suas terras, o que não significa que não tivessem sofrido muito. Vivianne, depois de ver o marido partir para a guerra, fica sozinha com a filha até aparecer um capitão alemão maléfico. Isabelle é uma jovem rebelde de 18 anos que lutará, à sua maneira, contra os nazis.

Gatilhos/Trigger Warnings presentes no livro: guerra, mortes de entes queridos, abandono, aborto espontâneo, imagens sangrentas, morte, antissemitismo, suicídio, cancro, escravatura, abuso sexual.

É, de facto, um retrato duro e sufocante de uma época horrível. Vemos de tudo um pouco, desde personagens mais frágeis até personagens lutadoras.

A escrita é simples e a autora soube mostrar bem os momentos mais violentos da história, como a violência física e a violência sexual. Também foi capaz de mostrar eficazmente, e sem tornar a história em algo doce, os momentos mais leves e não tão tristes.

Apesar de tudo o que indiquei, estava à espera de algo mais. Percebo a intenção de a atenção estar toda nas irmãs, que são, de facto, as personagens mais complexas e mais desenvolvidas, mas o livro seria mais rico se tivesse mais perspetivas.

4/5 estrelas.




De seguida, temos Samitério de Animais, de Stephen King. Louis Creed é um jovem médico que pensa ter encontrado um bom lugar em Maine. Um lugar onde é feliz com a mulher e os filhos. Além disso, tem uma boa casa e trabalha numa universidade. Um dia, decide explorar os arredores e encontra um cemitério de animais de estimação perto da sua casa. Depois desse cemitério, onde muitos túmulos apresentam caligrafias infantis, Louis encontra um outro cemitério, mas este tem forças malignas. As histórias do vizinho de 80 anos podem, afinal, não ser fruto da imaginação do idoso.

Gatilhos/Trigger warnings presentes no livro: Morte de animal de estimação, doença, morte de criança, luto, violência física.

Percebo o fascínio que as pessoas têm pelo King. Afinal, o que ele faz é obra. Já escreveu muitos livros ao longo da sua vida e gosta muito de explorar a mente humana e os seus aspetos mais negativos e sujos. Ainda assim, eu não consigo gostar muito dele.

De facto, a sua escrita nada floreada é um motivo que leva muita gente a adorar as suas histórias. A exploração da mente humana também é algo que fascina muitos leitores. Contudo, não achei as personagens nada de especial. Gostei do vizinho de 80 anos, o Crandall. Não gostei de como a esposa do protagonista praticamente existe para o prazer sexual de Louis e pouco mais. Vemos vislumbres dos momentos maternais, mas nada de especial. Ela é só alguém que faz parte da vida do protagonista. Louis é uma personagem não muito interessante, se bem que foi bom ver o pai ser o mais sentimental e mostrar o seu luto em relação a grandes perdas da sua família. Afinal, os homens também têm sentimentos e são humanos. Mas não gostei dele na mesma.

Uma outra coisa que me incomoda é o facto de tornar a cultura nativa-americana em algo maléfico e macabro. O cemitério, pelos vistos, tinha forças malignas por causa dos nativos. Esta coisa de tornar a cultura de um povo que não segue os padrões do homem branco em algo mau e que deve ser temido não deveria existir. Faz imensos estragos. O autor não precisava de usar mitos dos nativos para tornar a sua história mais assustadora e estranha. Bastava dizer: "olha, acontecem coisas mesmo muito macabras nesse cemitério, mas ninguém sabe explicar porquê". Pronto.

2.5/5 estrelas.




A última "Formiga Literária" é sobre Murder on the Orient Express, de Agatha Christie. Já todos devem conhecer Poirot, o grande detetive criado pela Rainha do Crime. Neste livro, Poirot está no Expresso Oriente, que para por um bocado devido aos estragos causados pela neve. Entretanto, descobrem que um americano foi assassinado a bordo. Ninguém pode sair do comboio até Poirot conseguir desvendar o mistério. Afinal, como é que pode ser complicado descobrir um culpado num grupo tão pequeno de viajantes, principalmente quando estão todos fechados num comboio?

Gatilhos/Trigger warnings presentes no livro: morte/assassinato (infelizmente, não consigo lembrar-me de outros gatilhos).

É a segunda vez que leio um livro de Agatha Christie. O primeiro que li foi And Then There Were None. Gostei imenso dessa história. Muito envolvente até ao fim. Não posso dizer o mesmo quanto a esta aventura de Poirot. Primeiro, não gostei nada de conhecer Poirot. Demasiado altivo para mim. Posso dizer que os motivos do crime foram muito bem explorados e, de facto, fazem o leitor sentir como se alguém estivesse a apertar o seu coração. De resto, não achei nada de especial. O livro que mencionei anteriormente foi muito mais empolgante. Este soube a pouco. De qualquer forma, a escrita de Christie é ideal para histórias de crimes e ela tem muito talento no que toca a fazer o leitor sentir todo o tipo de emoções, principalmente nos momentos em que os culpados e as suas razões para cometerem um determinado crime são revelados.

2.5/5 estrelas.







Até breve!






 




Stranger Things - Mentes Inquietas, de Gwenda Bond, é o primeiro livro de um conjunto de prequelas baseado em Stranger Things, uma série televisiva de Ficção Científica da Netflix. Neste livro, conhecemos a mãe da Eleven, uma das protagonistas da série. A mãe da Eleven, Terry Ives, é uma estudante universitária nos anos 70 que assiste às várias tensões sociais e políticas dos EUA. Ao mesmo tempo, só quer focar-se na sua vida. No entanto, ao ver que precisa de dinheiro, acaba por fazer parte de uma experiência sinistra de um laboratório misterioso. O que se passa no laboratório? Qual é o propósito da experiência? O que estarão a fazer ao seu corpo e, principalmente, à sua mente?


Sou uma grande fã da série. Eu fiquei totalmente rendida à história logo na primeira temporada. A Eleven é praticamente a minha personagem favorita e, por isso, fiquei contente ao saber que iriam lançar prequelas relacionadas com a série e que a primeira seria sobre a mãe dela. Mas o livro soube a muito pouco...


Terry Ives, mãe da Eleven, interpretada por Aimee Mullins.
Fonte.

Um dos grandes aspetos positivos relativamente ao enredo é a maneira como o contexto histórico está incluído nesta história de ficção científica sobre experiências com a mente humana. Tal como a série nos faz sentir que estamos novamente nos anos 80, o livro sabe transportar-nos até aos EUA dos anos 70. São-nos apresentadas de forma inteligente situações políticas, como a Guerra do Vietname e a necessidade de recrutar homens jovens. Também é engraçado ver as personagens entusiasmadas com referências pop da altura, como O Senhor dos Anéis. Portanto, quanto à contextualização histórica, penso que o livro faz um bom trabalho, não superando, de qualquer forma, a qualidade da série nesse aspeto, claro. Mas o cenário ficou bem feito.
Ainda sobre o enredo, ele é muito simples e, como disse, bem construído, mas poderia ter sido muito melhor. Depois da primeira temporada, muitos fãs, como eu, ficaram interessados na história da mãe da Eleven, até porque ela aparece durante uns segundos na série. As experiências de Terry levaram à Eleven que conhecemos. Posto isto, como não poderiam os fãs ficar curiosos quanto a um livro sobre Terry? Bem, os grandes detalhes da série estão lá, como o laboratório e os seus estratagemas nada éticos. Também vemos um pouco mais do cientista malvado da série, Dr. Benner, como as suas intenções, algo que os fãs já tinham percebido na série. Portanto, o que é que o enredo tem de bom? Não sei exatamente. Tem vários ingredientes que levaram ao sucesso da série, mas que não resultaram tão bem neste livro, pois não foram o suficiente para tornar este livro numa grande prequela. O enredo da série é brutal por ter muitas coisas a acontecer e essas coisas estão sempre interligadas. Pode parecer complexo, mas não é. Além disso, é muito cativante e entusiasmante. Acho que o livro não foi isso, a não ser, talvez, nas últimas páginas. É uma pena, sinceramente. Se o livro tivesse a mestria da série, teria brilhado tal como o projeto da Netflix.

A escrita é simples e mantém o leitor entretido. Não é o estilo de escrita mais fabuloso do mundo, mas serviu o seu propósito, ou seja, foi bastante cinematográfico e não era floreado. Penso que é uma escrita suficientemente boa para quem gosta da série, mas não costuma ler.

Quanto às personagens, não me parece que a autora tenha feito um bom trabalho. A série teve o sucesso que teve não só pela nostalgia dos anos 80 e das suas referências à cultura pop, mas também graças às diferentes personalidades das personagens, principalmente das personagens mais novas. Neste livro, as personalidades das personagens são... fracas. Não nos aquecem nem nos arrefecem. São até um pouco desinteressantes e muito comuns. Não se destacam muito. Sim, Terry é uma pessoa curiosa que quer o bem e proteger as pessoas que ela adora, mas não passa disso. E onde está o desenvolvimento, o crescimento destas personagens? Ao longo do livro, são mais do mesmo que vimos desde o momento em que as conhecemos. A autora deveria ter feito um melhor trabalho, porque ela provavelmente sabia que um dos grandes pontos fortes da série é precisamente o vasto e único conjunto de personagens.


Dr. Benner (Matthew Modine) e Eleven (Millie Bobby Brown).
Fonte.


Concluindo, Stranger Things - Mentes Inquietas é uma leitura suficientemente boa para os fãs da série que ficam fartos de esperar pelas próximas temporadas. É também um bom livro para quem gostou da série e que, apesar de a leitura de livros não fazer parte da sua vida, quer ler a prequela. No entanto, os grandes fãs da série poderão ficar desiludidos. Não fiquei totalmente triste, mas estava à espera de uma história melhor. Bond tentou usar os pontos fortes da série, mas não os pôs em prática na perfeição como os criadores da série. Terry Ives merecia uma história mais interessante.


Classificação: 3/5 estrelas.




Raparigas Como Nós, de Helena Magalhães, é um romance Jovem Adulto que segue as pisadas de Isabel. Viajando entre as memórias de 1999 e as vivências de 2004 (sendo este ano o presente da protagonista e não 2018 ou 2019, por exemplo), vivemos, com ela, aventuras, como festas e tardes na praia, bem como desventuras, como experiências com drogas e traições. É um livro sobre amores de adolescência, amores mais maduros, drogas e lições que ficarão para sempre na memória da protagonista.


A escrita da Helena Magalhães é simples e envolvente, se bem que, de vez em quando, há uma tentativa de ter passagens muito mais maduras do que a própria narradora, que é a protagonista do romance, a Isabel.  De qualquer forma, é um estilo que deixa o leitor curioso e a querer ler um pouco mais.


O enredo é apelativo quer para um público adolescente, quer para um público que possa sentir nostalgia relativamente aos seus tempos de folia juvenil. É uma história leve, mas, ao mesmo tempo, com aspetos mais pesados, pois fala imenso sobre o consumo e o vício das drogas, lembrando constantemente de como elas são perigosas. Um dos temas que gostei mais de ver neste livro é a diferença entre o amor pela pessoa e o amor pela ideia que temos da pessoa. É uma das coisas mais bem exploradas e executadas neste romance. É mesmo o ponto forte desta história. Por um lado, temos Afonso, um rapaz que Isabel, aos 17 anos, conhece numa festa. A partir daí, saem imenso juntos e vão conhecendo as personalidades de cada um aos poucos. Por outro lado, temos Simão, uma paixoneta de Isabel quando ela tinha 14 anos. Isabel nunca conheceu muito bem Simão, mas gostava do seu aspeto de bad boy e ela pensava que ele era muito fixe e tudo o mais. Através destas duas personagens masculinas, Magalhães consegue vincar muito bem que, por vezes, só temos mesmo uma paixoneta, mas não estamos mesmo apaixonados pela pessoa, uma vez que, na realidade, gostamos da ideia que formamos acerca dela e não da personalidade dela. O amor é mais verdadeiro e bonito quando conhecemos a pessoa e nos focamos nela e não na ideia que temos dela.

Também notei a presença de temas que, penso eu, deveriam ser explorados cada vez mais nesta literatura mais juvenil, como o sexismo e os conflitos e as dinâmicas familiares. Só não gostei da forma como a autora introduziu uma personagem gay só para dizer que o livro tem uma personagem gay. Se for para ter representatividade, a personagem deveria ter uma presença mais significativa no livro e não ser uma mera passagem que apenas reflete como a protagonista é muito boazinha e aceita bem pessoas diferentes. A tentativa de abordar questões feministas também está lá, mas, como já li o livro há algum tempo, não posso dizer se gostei disso ou se está bem feito. Sei que há esta tentativa de dizer que não devemos ver as outras raparigas como rivais, mas não sei se essa ideia foi bem desenvolvida. Por exemplo, eu pensava que um dos objetivos deste livro era mostrar que as raparigas poderiam ter as suas diferenças e que não seriam julgadas e odiadas por isso entre si. Afinal, o título sugere uma ideia de irmandade feminina até. No entanto, umas quantas passagens dão a entender o contrário. A protagonista parece achar-se superior às outras raparigas porque acha que não é tão parva como elas ou algo assim. São incongruências nas mensagens que a autora queria transmitir que me deixam mais com o pé atrás do que os clichés e a escrita.


Relativamente às personagens, elas são e têm clichés, mas gostei de conhecer a Isabel quando tinha 14 anos. Gostei da sua ingenuidade e da sua inocência. De resto, parecia que cada personagem correspondia a um tema que a autora queria explorar, ou seja, elas não tinham uma existência própria. Eram um meio para atingir o fim, sendo este o de transmitir lições e abordar determinados assuntos.


Concluindo, Raparigas Como Nós é um dos primeiros passos interessantes dados por uma editora tradicional portuguesa quanto à literatura YA nacional. Este livro faz-nos viajar e recordar as nossas vivências, os nossos amores e desamores, as partes agridoces da adolescência e os momentos bons e maus. Está bem escrito e é uma leitura envolvente. No entanto, poderia ter sido muito melhor, principalmente quanto à criação das personagens e à abordagem de determinados temas. Contudo, não foi uma leitura horrível.


Classificação: 3/5 estrelas.




City of Ghosts, de Victoria Schwab, é o primeiro volume de uma trilogia infantojuvenil sobrenatural. A protagonista, Cassidy Blake, um dia, quase morreu por afogamento, mas foi salva por um fantasma, Jacob, que acabou por se tornar num amigo dela. Desde então, Cassidy consegue ver fantasmas. Essa nova habilidade complica a vida de Cassidy nos próximos tempos, pois os pais dela aceitaram fazer um programa televisivo sobre cidades fantasmagóricas. A primeira paragem é Edimburgo, a capital escocesa conhecida como Cidade dos Fantasmas. Que experiências Cassidy e Jacob irão ter nesta cidade nebulosa com uma arquitetura bela, mas sombria?


Victoria Schwab (ou V. E. Schwab) é conhecida pelas histórias de Fantasia escritas para um público mais velho. Já não é a primeira vez que ela escreve livros para um público juvenil, mas foi com City of Ghosts que muitos fãs de outros livros da autora conheceram uma nova faceta dela, a de também saber criar histórias para os mais novos. E que bela história que temos aqui!


Schwab é genial nas suas histórias mais adultas. A maneira como ela nos faz conhecer as suas personagens complexas e querer criar ligações com elas prova a sua mestria em formar personagens interessantes que enriquecem a história. Em City of Ghosts, nós também temos personagens com personalidades muito diferentes e também queremos conhecê-las, mas o foco não está tanto nas personagens, mas sim nas aventuras delas. Portanto, este livro prova uma outra habilidade de Schwab, a de saber inventar peripécias entusiasmantes. Também ajuda o facto de a escrita dela, neste livro, ser muito mais direta e simples do que n'Uma Magia Mais Escura, por exemplo.


Capa da edição francesa.
Fonte.


Como disse, o enredo é rico em aventuras. A ação nunca tem momentos "mortos". Há sempre algo a acontecer, há sempre uma descoberta a fazer, há sempre um problema por resolver. É, portanto, uma história envolvente que sempre nos dá mais alguma coisa e nunca nos deixa frustrados ou aborrecidos. Também ajuda o facto de a ação ser baseada numa viagem. As crianças gostam de conhecer coisas novas e conhecer um lugar como Edimburgo deve ser delirante, principalmente para aquelas que, através deste livro, imaginam esse espaço como algo sombrio, misterioso e ideal para aventuras e para fazer a sua imaginação trabalhar.


Quanto às personagens, foram muito bem construídas e penso que são ideais e suficientemente fascinantes para o público-alvo da história. Quando somos crianças, imaginamos muitas coisas e inventamos as nossas próprias aventuras nas nossas cabeças. Como seria enfrentar um fantasma sem a ajuda dos pais, por exemplo? Como seria ter um fantasma como amigo? 
E Cassidy Blake passa exatamente por essas aventuras que tanto imaginamos, mas, ao acompanharmos Cassidy, já não estamos apenas a imaginá-las, já que até parece que estamos mesmo a vivê-las.
Cassidy não é muito ingénua e é muito independente, mas, claro, não deixa de ser uma menina de 12 anos. Cassidy adora livros cheios de aventuras e magia e gosta de tirar fotografias, tendo a sua máquina fotográfica antiga sempre consigo. Ela consegue ver fantasmas e gosta de fantasmas que são como Jacob, simpáticos e bons, mas é-lhe difícil ter de enfrentar espíritos malignos, como a Raven in Red, uma mulher que, enquanto fantasma, tenta roubar o fio da vida das crianças, incluindo o da Cassidy. Além disso, como alguém que está entre os dois mundos, Cassidy tem a missão de enviar as almas para além do Véu, o lugar que separa os mortos dos vivos. Assim, Cassidy tem de fazer muitas coisas que uma criança de 12 anos normal nunca faria. Isso também torna esta personagem muito interessante, pois as crianças gostam de imaginar que têm poderes e que conseguem enfrentar coisas assustadoras e Cassidy vive os sonhos dessas crianças.
Jacob é um fantasma que é amigo de Cassidy e, já aí, é uma personagem muito intrigante. Quem não gostaria de ter um fantasma bonzinho e divertido como amigo? Além disso, o facto de ele ser um fantasma é como uma forma de falar sobre algo que é muito comum entre as crianças, isto é, os amigos imaginários. Foi um bom toque da parte da autora em ter um fantasma como um grande amigo de Cassidy. Ele tem as qualidades que um bom amigo deve ter, como a vontade de ajudar, a capacidade de fazer rir, a habilidade de ser sério quando é necessário, etc. Quando estão juntos, Cassidy e Jacob são uma dupla engraçada.
Lara é uma menina que Cassidy e Jacob conhecem em Edimburgo. Ela também consegue ver fantasmas e sabe imenso sobre esse modo de vida. É ela que faz Cassidy perceber a missão importante que elas têm, a de ajudar na passagem dos espíritos que ainda estão na Terra para o mundo além do Véu. É muito parecida com Cassidy, pois é muito desenrascada, determinada e inteligente.
Raven in Red é uma antagonista que tem uma história trágica, mas não deixa de ser uma inimiga que quer tirar a vida às crianças humanas. É, deste modo, uma antagonista multifacetada. Não é má apenas para ser a vilã da história e para assustar os jovens leitores. Ela mostra como, muitas vezes, a maldade existe por algum motivo, mas não deixa de provar que, ainda assim, não podemos deixar que o mal vença.



Capa da edição alemã.
Fonte.



Em suma, City of Ghosts é um início promissor de uma nova trilogia infantojuvenil sobrenatural que promete dar aos miúdos e graúdos aventuras fantásticas, personagens interessantes e uma escrita envolvente. As descrições e as peripécias fantasmagóricas tornam este livro na leitura ideal para o Halloween, mas, devido ao talento de Victoria Schwab, é também um livro maravilhoso que pode e deve ser lido em qualquer altura do ano.

P.S.: Até agora, não foi publicado em Portugal. É uma pena, uma vez que acho que muitos jovens leitores iriam gostar de ler este livro.


Classificação: 4.5/5 estrelas.



Sinopse original.


Em A Maldição de Hill House, de Shirley Jackson, John Montague, um especialista e estudioso do oculto, vai à Hill House procurar algo concreto que possa provar a existência do sobrenatural. Também vão para lá Theodora, a sua assistente, Luke, o futuro herdeiro do local, e Eleanor, uma mulher solitária e frágil que já teve encontros com poltergeists.

No início, era suposto ser uma experiência focada em fenómenos inexplicáveis. No entanto, rapidamente passa a ser uma luta pela sobrevivência. Serão eles capazes de sobreviver uns dias em Hill House?


Tive conhecimento deste livro quando a Netflix lançou uma série baseada nele e que tem o mesmo título. Apenas vi o primeiro episódio, mas fiquei imediatamente curiosa. Como prefiro ler o livro primeiro e, depois, ver a adaptação cinematográfica/televisiva, deixei de ver a série. Tempos depois, ofereceram-me o livro. Li-o e achei o aspeto psicológico muito interessante, mas não foi uma leitura muito boa.


Aesthetics.
Fonte.


Infelizmente, este livro não é inesquecível. Li-o há mais de um ano e não foi uma experiência impactante, a não ser mesmo o aspeto do terror psicológico, que é um dos poucos pontos fortes do livro. Explora muito bem a mente de cada personagem, principalmente os seus medos. Talvez seja essa a razão pela qual muita gente gostou do livro. Contudo, será que é o suficiente ver um pouco dos receios das personagens e causar algum alarido com isso? Aliás, quando chegamos ao fim do livro, parece que houve alarido para nada. Sim, dá para ver muito bem o estado psicológico e emocional das personagens e como é esse estado delas que confere terror à história, uma vez que é o medo delas que nos faz antecipar por algo. Todavia, depois, não é o que estamos à espera e o entusiasmo desaparece.

Além disso, o desenvolvimento do enredo é feito de forma lenta, acabando por ser uma leitura um pouco aborrecida.


A escrita da autora pode ser mais um dos poucos pontos positivos do livro. O seu estilo mostra bem a intenção de Shirley Jackson, isto é, explorar e "brincar" com as mentes das personagens. Agora, se foi cativante e envolvente? Do pouco que eu me lembro, gostei dos diálogos e a parte mais descritiva era interessante devido ao foco nas cabeças das personagens. Porém, não posso dizer que é um dos melhores estilos de escrita de sempre.


Ilustração baseada no livro.
Fonte.


Quanto às personagens, estas pareciam ter muito potencial no início. Cada uma tem as suas particularidades e gostei de como elas não foram feitas para serem adoradas pelos leitores. São seres humanos com imperfeições e, lá está, a imperfeição é uma das coisas mais exploradas quando um livro tem muito a ver com medos psicológicos. No entanto, aos poucos, as personagens passaram a ser desinteressantes e já não davam algo novo nos últimos capítulos.
Ainda assim, gostei da maneira como Eleanor foi criada pela autora. Ela é que nos faz sentir que estamos a ler uma história de terror, bem como a casa em si. Aliás, será que a casa pode ser vista como uma personagem também? Talvez sim. Na realidade, a casa era mais interessante do que as personagens.

Em conclusão, A Maldição de Hill House é um romance de mistério e de terror psicológico que prometia dar muito, mas não me deu grandes coisas. Se, como eu, estão à espera de uma história de fantasmas, deixo-vos este aviso: o livro nada tem a ver com fantasmas. Tem, sim, a ver com o estado psicológico das pessoas e como ele afeta as vidas delas e tudo o que as rodeia. É, deste modo, interessante de um ponto de vista psicológico, mas nada mais. Tinha potencial para ser algo mais, como um romance sobrenatural, mas acabou por ser um livro pouco memorável e muito vazio.


Classificação: 2.5/5 estrelas.



Salt to the Sea é um livro de ficção histórica YA que conta com quatro perspetivas diferentes: Joanna, uma rapariga da Lituânia com alguma experiência como enfermeira; Florian, um soldado da Prússia com um tesouro roubado e que foge dos Nazis; Emilia, uma rapariga polaca que está prestes a dar à luz; e Albert, um Nazi com ilusões de grandeza. Este livro junta estas personagens fictícias a factos reais da História que, infelizmente, são muito desconhecidos do público geral: o naufrágio de um navio alemão, Wilhelm Gustloff, no Oceano Báltico causado por um submarino soviético.


Este romance histórico está, na realidade, relacionado com um outro romance histórico YA da autora, O Longo Inverno, pois Joanna é prima da protagonista desse livro. No entanto, as ligações terminam aí. Aliás, eu não estou a falar apenas de curiosidades da autora, mas sim em termos de qualidade dos livros. Para mim, O Longo Inverno foi um livro maravilhoso, mas Salt to the Sea foi uma desilusão.


Em primeiro lugar, admiro a autora por querer dar a conhecer uma das grandes tragédias da Segunda Guerra Mundial, mas que, infelizmente, é muito pouco falada. 9000 pessoas morreram, incluindo 5000 crianças. A embarcação tinha, ao todo, 10.500 passageiros. Foi, portanto, um acontecimento horrível e ainda bem que Sepetys decidiu usar a ficção histórica para que mais pessoas soubessem da existência deste naufrágio. Nesse aspeto, o enredo está bem conseguido. De facto, Sepetys fez um bom trabalho e não foi necessário ela aproveitar-se de pessoas reais para poder usá-las como personagens. Através de personagens que nunca existiram, ela conseguiu cumprir um dos grandes objetivos da ficção histórica: ensinar História através da ficção.

Quanto à escrita, continua impecável como no primeiro livro da autora que eu li. Simples, direta e envolvente. No entanto, os capítulos muito pequenos, que, para mim, foram um dos pontos positivos n'O Longo Inverno, não resultaram neste romance. Penso que a vontade de ter quatro perspetivas completamente diferentes não ajudou para que a técnica dos capítulos curtos resultasse. Se ela queria tanto ter quatro protagonistas, deveria, então, ter escrito capítulos mais longos. Também poderia ter "sacrificado" alguns protagonistas. Poderia ter tido apenas dois e não quatro, por exemplo.

O que quero dizer é que o estilo de escrita continua bom, mas a técnica dos capítulos curtos não resultou, tendo em conta a quantidade de informação e o tempo debaixo dos holofotes que a autora queria dar às quatro personagens.


Aesthetics.
Fonte.


Relativamente às personagens, não tenho muito a dizer. Apesar das situações extremamente angustiantes, violentas e trágicas, não senti muita empatia por elas. Além disso, a questão dos capítulos curtíssimos prejudicou essa parte de fazer o leitor conhecer as personagens. Dá para ver que, como disse anteriormente, Sepetys deveria ter escolhido apenas dois protagonistas. As personalidades e as histórias de Joanna e Florian estão muito mais bem desenvolvidas do que Emilia e Albert. Sem dúvida alguma que ler os momentos antes e após o naufrágio foi algo intenso para mim e, aí, senti empatia, mas por causa da narração em si e não pelas personagens. Eu percebo que a autora queria analisar e fazer sobressair várias perspetivas muito diferentes e, de facto, estas quatro personagens têm características únicas. No entanto, por vezes, menos é mais. A autora deveria ter mesmo contado apenas duas histórias fictícias dentro da história verídica do naufrágio.



Aesthetics.
Fonte.


Concluindo, Salt to the Sea não conseguiu chegar aos calcanhares d'O Longo Inverno. A sua sinopse prometia muito e criei expectativas altas. Todavia, foi uma leitura que me deixou desiludida. Por vezes, isto acontece quando um autor quer meter muitas coisas diferentes num livro, mas, afinal, não sabe bem como fazer isso. Dá para ver que a autora usou fórmulas d'O Longo Inverno, como os capítulos curtos e a escrita sem rodeios. Mas, tendo em conta que os objetivos para este livro eram diferentes, as fórmulas anteriores resultaram num livro assim-assim. Pelo menos, aprendi alguma coisa e, nesse aspeto, este romance mostra a importância da ficção histórica.


Classificação: 3/5estrelas.