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A Biblioteca da Daniela

A Biblioteca da Daniela

Formigas Literárias.png

 

As Formigas Literárias vão continuar a ser opiniões pequenas, mas vão passar a consistir em, basicamente, quatro alíneas:

  1. Qualidade da escrita;
  2. Desenvolvimento do enredo;
  3. Nível da leitura;
  4. Personagens.

Tendo em conta que são leituras que foram realizadas há, pelo menos, dois anos, já não me recordo de muitos detalhes, mas tenho algumas ideias vagas das leituras em si e penso que estas alíneas, que encontrei no Pinterest, poderão ser boas orientações nestas Formigas. A partir de agora, farei estas opiniões desta forma.

 

As Formigas Literárias de hoje são sobre dois livros YA que li em 2020.

 

Four Dead Queens, de Astrid Scholte, é um romance de Fantasia YA que, entretanto, a Gailivro publicou em Portugal. O seu título é A Morte de Quatro Rainhas. "Keralie Corrington tem apenas dezassete anos e parece inofensiva mas, na verdade, é uma mentirosa e uma das ladras mais habilidosas de Quadara. Varin, por outro lado, é um cidadão ín­tegro da região mais desenvolvida de Quadara, Eonia. Os dois conhecem-se quando ela lhe rouba um objeto muito importante, colocando a vida dele em perigo. Ao tentar recuperar o que lhe foi roubado, Varin e Keralie veem-se envolvidos numa conspi­ração que matou as quatro rainhas de Quadara.

Sem alternativas e a fugir do ex-patrão de Keralie, ambos percebem que a melhor opção é unirem-se para descobrir o as­sassino e salvar as suas próprias vidas, no entanto, a aproxima­ção é perigosa e um romance floresce.

Keralie e Varin são obrigados a superar os seus segredos mais sombrios na esperança de terem um imprevisível futuro juntos, mas primeiro precisam de permanecer vivos e descobrir a razão por detrás da morte das quatro rainhas da nação".

 

  1. Qualidade da escrita: Estamos perante um livro que mistura Ficção Científica com Fantasia e, assim sendo, poderíamos ter uma escrita muito pesada e extremamente detalhada, mas não é esse o caso. Na realidade, é leve e simples, mas é pena que não se destaque dentro do género, ou seja, que não seja suficientemente brilhante. Ainda assim, como primeiro livro desta autora, dá para ver que tem muito potencial.

  2. Desenvolvimento do enredo: Ocorre de forma um pouco lenta, principalmente a meio. Os últimos capítulos contêm a intensidade que o livro merecia ter tido como um todo. O melhor ficou para o fim, o que foi uma pena, pois a leitura estava a ser aborrecida a meio. A autora deveria ter criado alguns momentos mais explosivos nos capítulos do meio para tornar a leitura mais equilibrada.

  3. Nível da leitura: É um bom pontapé de saída para quem não tem experiência no mundo da literatura da Fantasia, pois não é fortemente detalhada, mas é suficientemente rica na construção do mundo e das personagens para manter o leitor minimamente interessado (apesar, como disse, do enredo morno).

  4. Personagens: É muito comum os livros de Fantasia terem um elenco enorme, mas não é exatamente o caso deste romance, se bem que não deixa de ter um leque curioso. Ainda assim, Keralie, Varin e as Rainhas poderiam ter sido personagens mais complexas, se bem quegostei mais de conhecer as Rainhas do que Keralie e Varin. De qualquer modo, a autora atribuiu um plot twist fenomenal à Keralie. Foi, sem dúvida alguma, um dos pontos mais fortes do livro.

 

Classificação: 3 de 5 estrelas.

 

Bertrand;
Wook.

 

 

 

 

"Serenatas românticas, beijos à chuva e declarações de amor épicas... Isto só acontece nos filmes!

A Audrey não quer saber de amor nem de paixões piegas. A vida dela já tem drama que chegue! Para fugir ao caos que se instalou em casa, ela arranja um trabalho no cinema local, sem imaginar que é precisamente aqui que vai encontrar um drama chamado Harry.

O Harry é um aspirante a realizador de cinema e encaixa em todos os clichês lamechas dos grandes romances. Rosas vermelhas, velas e charme de bad boy, ele vai tentar de tudo para conquistar a descrente Audrey. Mas, por favor, poupem-na! É bem sabido que o amor da vida real não é como nos filmes, certo? Ou talvez a Audrey se surpreenda...

Isto Só Acontece nos Filmes recebeu excelentes críticas e é um romance sobre romance, um grito feminista aos estereótipos impostos às jovens raparigas e uma leitura absolutamente hilariante."

 

  1. Qualidade da escrita: Não é marcante, mas entretém e fará as delícias aos jovens leitores que ainda não sentem um grande amor pela leitura. É uma escrita simples e perfeita para adolescentes.
  2. Desenvolvimento do enredo. Desenvolve-se com naturalidade e sem pressas, apesar de ter certos vazios. Acho que ainda tinha mais espaço para, por exemplo, desenvolver mais personagens como o Harry e, ainda, outras questões da vida da protagonista. Apesar disso, é um enredo que entrega bem outras coisas que promete, como a desconstrução de clichés dos filmes românticos e a exploração dos estereótipos incutidos nas mentes das raparigas, principalmente quanto às questões amorosas e sexuais.

  3. Nível da leitura: Um YA que foi, de facto, escrito para os adolescentes, mas que também serve como uma porta entreaberta para os adultos sobre as mentes jovens e como os problemas dos adultos afetam os mais novos. Aconselhado para quem procura por um romance contemporâneo YA que, realmente, quebra os clichés do universo YA.

  4. Personagens: Audrey é uma personagem complexa e interessante de se acompanhar por ser complexa e humanamente imperfeita e realista. Infelizmente, não me recordo muito bem das restantes personagens, a não ser o facto de achar que o Harry deveria ter tido uma construção mais sofisticada e elaborada.

Classifcação: 4 de 5 estrelas.

 

Isto Só Acontece Nos FilmesBertrand;
Wook.

 

O que acharam destas Formigas Literárias? Já leram estes livros? Se sim, o que acharam destas leituras?

 

 

 

 

Como tenho opiniões acumuladas desde 2020, optei por voltar a escrever Formigas Literárias, ou seja, opiniões mais pequenas e realizadas em grupos. 

 

Em primeiro lugar, vou falar sobre Strange the Dreamer, de Laini Taylor. Neste primeiro livro de uma duologia de Fantasia YA, o sonho escolhe o sonhador.

Desde os seus cinco anos, Lazlo Strange está obcecado com a mítica cidade perdida de Weep, mas seria necessário uma pessoa mais corajosa do que ele para ir procurá-la. Depois, uma grande oportunidade surge na figura de um herói chamado Godslayer e num bando de guerreiros lendários. Ele deve pegar na oportunidade ou perder o seu sonho para sempre.

O que aconteceu para fazer desaparecer Weep? O que Godslayer matou e que era visto como deus? E qual é o problema misterioso que ele deve agora procurar resolver?

As respostas estão em Weep, bem como muitos mais mistérios, incluindo uma deusa de pele azul que visita Lazlo nos seus sonhos.

 

Infelizmente, não consegui ver neste o encanto que senti num outro livro desta autora que já li, A Quimera de Praga. A escrita é muito poética e bonita, mas é precisamente isso que acaba por estragar um pouco este livro. Parece que a autora só quis tornar o texto belo e não se esforçou tanto no enredo e na criação das personagens. Normalmente, gosto de escritas mais elaboradas e com pinceladas poéticas, mas isso foi um exagero aqui. Chega ao ponto em que é praticamente impossível lembrar-me da história. É verdade que foi lida em janeiro de 2020, mas não me lembro de nada. Mesmo nada. É um livro que não vai para além da escrita forçadamente bonitinha. Foi mesmo uma desilusão, pois A Quimera de Praga, para mim, tinha o melhor dos dois mundos: escrita fascinante e enredo intenso e inquietante. Também não gostei tanto da continuação d'A Quimera de Praga. Portanto, o melhor será desistir desta autora, o que me entristece um pouco.

Classificação: 2.5/5 estrelas.

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O próximo livro é uma narrativa em verso contemporânea YA e foi escrita por Elizabeth Acevedo. Em The Poet X, Xiomara sempre guardou as suas palavras dentro de si. Quando tem de ser firme no seu bairro em Harlem, os seus punhos e a sua ferocidade é que falam por ela.

Mas X tem segredos: os seus sentimentos por um rapaz da sua aula de biologia e um caderno cheio de poemas que ela mantém debaixo da cama. E um clube de poesia slam que irá colocar esses segredos sob os holofotes.

Porque, apesar de o mundo não querer ouvi-la, Xiomara recusa ficar em silêncio.

 

É um lindo livro sobre racismo, feminismo, fé e a busca pela própria voz e perceber como usá-la. Através de um formato simples e cativante, Acevedo explora imensos temas e situações que são de extrema importância e que devem ser falados, principalmente perante um público mais jovem. É uma história brilhante e a sua protagonista é tão encantadora quer na sua sensibilidade, quer na sua força. Mais do que nunca, os livros YA são grandes fontes de entretenimento, de educação e de arte e The Poet X é um desses livros. Deixa-nos a querer saber mais da protagonista e da forma como vê o mundo, faz-nos aprender mais sobre os outros e nós mesmos e é de uma delícia literária única. Impactante e magnífico. Não me admira que tenha recebido tantos prémios.

Classificação: 5/5 estrelas.

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E se formos nós, da dupla Becky Albertalli e Adam Silvera, marca o fim da publicação de hoje. É um romance contemporâneo YA sobre o amor, a amizade, a família e a adolescência. "Não sei se somos uma história de amor ou se o nosso amor é uma história.

Arthur só vai ficar em Nova Iorque durante o verão, mas ele acredita que isso não é impedimento para conhecer o grande amor da sua vida. Tal como entoam os musicais da Broadway de que Arthur tanto gosta, o universo pode fazer surgir uma paixão a qualquer momento, quando menos se espera…

Ben não acredita no amor. Ele só quer distância das conspirações do universo e dos seus planos secretos. Porque se o universo fosse realmente seu aliado, ele ainda estaria numa relação e não no posto dos correios para devolver todos os pertences do seu ex-namorado.

Um dia, Arthur e Ben cruzam-se. Um encontro aparentemente banal dá início a uma história de amor cheia de emoções fortes, percalços, contrariedades e desafios. Mas, afinal, o que terá o universo reservado para estas duas almas apaixonadas? Talvez nada. Talvez Tudo!"

 

Já conhecia Becky Albertalli e gostei dos dois livros dela que já li (O Coração de Simon Contra o Mundo e Os Altos e Baixos do Meu Coração). Ainda não conhecia o trabalho de Adam Silvera e espero ler os seus trabalhos a solo um dia. Apesar disso, não posso dizer que adorei este livro. Foi uma leitura agradável, mas acho que criei expetativas elevadas e não foi tão surpreendente e maravilhoso quanto estava à espera. Gostei mais de Arthur do que de Ben, talvez porque Arthur é o coração mole e inocente, enquanto Ben protege-se mais no que toca a sentimentos, por exemplo. A escrita é simples e penso que a dinâmica dos autores é boa. Do que já ouvi sobre Silvera, não me admira que Albertalli consiga trabalhar bem com ele e que tenham conseguido criar de forma tão natural esta história. Ainda assim, faltou qualquer coisa. As personagens principais poderiam ter sido mais únicas, por exemplo, e as secundárias poderiam ter tido mais vida, digamos assim. E concordo com as pessoas que dizem que as constantes referências de cultura pop foram exageradas. De qualquer forma, é um livro que pode ser dado a um adolescente relutante quanto à literatura.

Classificação: 3/5 estrelas.

e se formos nós.png

 

 

Por agora, é tudo. Já leram estes livros? Se sim, gostaram deles?

 

You've Reached Sam
Bertrand;
Wook;
Blackwell's;
Book Depository.

 

You've Reached Sam, de Dustin Thao, é um romance YA contemporâneo com uma dose de magia sobre a morte, a vida e o luto. Julie, de dezassete anos, tem todo o seu futuro planeado: sair da sua pequena terra com o namorado Sam, ir para a universidade da cidade, passar o verão no Japão. Mas, entretanto, Sam morre. E tudo muda. Desesperada para ouvir a sua voz mais uma vez, Julie faz uma chamada para o telemóvel do Sam para ouvir a mensagem de correio de voz. E Sam atende o telemóvel.

O que farias se tivesses uma segunda oportunidade para dizer adeus?

 

Obrigada, Wednesday Books/St.Martin's Press e NetGalley, pelo eARC deste livro para, em troca, providenciar uma opinião honesta. Este livro foi lançado a 9 de novembro e eu deveria ter publicado a minha opinião um pouco antes dessa data, mas não foi possível. No entanto, finalmente, aqui está ela!

 

Este livro é uma bonita vénia ao amor e um retrato doloroso e tocante do luto. Com uma escrita simples e comovente, uma personagem principal que agarra facilmente o nosso coração e uma história repleta de dor, amor, culpa, nostalgia e confusão, este livro é capaz de fazer escapar, pelo menos, uma lágrima , fazendo-nos refletir sobre o quão breve a vida é e como devemos não só honrar os que partem, mas dar a nós mesmos afeto e mais oportunidades.

 

You've Reached Sam by Dustin Thao || Aesthetics Board | Book wallpaper,  Diverse books, Book bloggerFonte.

 

A história é simples, mas pode não ser o ideal para quem prefere um enredo criado de forma linear. Afinal, estamos perante uma mistura de momentos do presente da protagonista e memórias que ela revive. Contudo, acho que esta junção funcionou muito bem e não ficou confusa. Representa, na realidade, o que fazemos nas nossas vidas quando pensamos nos que já faleceram. Num momento, estamos a trabalhar e, de repente, estamos perdidos numa recordação. Assim, a forma como a narrativa está organizada é nada mais do que a própria vida e como ela funciona. É, claro, uma história extremamente focada nas emoções, sendo, talvez, algo mais passivo. É, ainda assim, agitada na mesma, na medida em que há um enorme conjunto de emoções e pensamentos, desde memórias boas e românticas até situações vazias de esperança e cheias de sofrimento. Sem dúvida alguma que a melhor parte é a forma como são apresentados os vários tipos de luto, desde a tentativa de esquecer tudo até à necessidade de querer continuar a estar com quem partiu. Ainda bem que o autor abordou o modo como as pessoas podem ser cruéis com aquelas que não seguem um processo defendido pela sociedade. Julie preferia não ser muito aberta quanto ao seu luto. Ela não queria ser vista, não queria estar com os outros ou, até mesmo, tentar ajudá-los, uma vez que ela própria não sabia como lidar com o seu próprio desgosto. Por isso, foi muito julgada pelos amigos de Sam, que até praticaram bullying por ela não fazer um luto público. Penso que o livro mostra muito bem que cada um sabe como deve viver o seu luto e passa muito bem essa mensagem. Entretanto, Julie aprende que não precisa estar sozinha e ainda bem que podemos ver essa aprendizagem, mas isso não quer dizer que ela deve mostrar ao mundo inteiro o que sente. O que interessa é que ela sabe com quem pode contar e que pode pedir ajuda. É, então, uma história muito humana.

 

O estilo de escrita de Thao é bonito e enternecedor. Não precisou de palavras caras, nem de excertos exageradamente poéticos e melancólicos para transmitir as suas mensagens, mas também não foi contido e libertou todo o peso das emoções que a história em si carrega, bem como Julie, principalmente. Este é o primeiro livro que publica e dá para ver que está a começar o seu caminho como escritor, mas já tem um estilo com imenso potencial e que promete brilhar ainda mais no futuro.

 

As personagens, por acaso, são o ponto mais fraco deste livro. Embora Julie seja uma personagem muito diversificada e complexa quanto às suas emoções, aos seus pensamentos e ao seu desenvolvimento enquanto pessoa, não posso dizer o mesmo quanto ao restante elenco. Por exemplo, não obtemos muito do Sam, a não ser o que ele diz nas chamadas que faz. Tudo o que sabemos e vemos dele é transmitido pela Julie e conforme a imagem que ela tem dele. A história seria mais rica se tivéssemos as perspetivas de Sam, de um familiar e de um amigo. É demasiado focado na Julie. Claro que ela é a protagonista e é tudo contado segundo a sua perspetiva, mas a história seria mais impactante se outras personagens também pudessem contar como lidam com o seu luto e como viam e veem Sam, não esquecendo a perspetiva de Sam. Julie conhece pessoas novas, fica mais próxima de um grande amigo de Sam e tenta estar mais em contacto com a família do namorado, mas não vemos quase nada sobre essas personagens, o que é uma pena. Teria sido melhor se ela tivesse passado mais tempo com elas e não apenas com Sam, se bem que o facto de ela apenas querer estar com ele seja uma maneira de mostrar como ela queria fazer o seu luto. De qualquer forma, teria sido interessante ver mais de outras personagens, mas Julie é mesmo uma protagonista com uma presença forte e capaz de nos cativar pelas suas imperfeições e emoções, passando por paixões como os livros e pelos seus sonhos e desejos.

 

50debcda09e4d31f34c0eac4db464cfd.jpgFonte.

 

Em suma, variando entre flashbacks, o presente e chamadas de telemóvel, Dustin Thao fez um excelente trabalho na forma como representou o luto e as dúvidas existenciais normais que alguém tão jovem tem quando perde repentinamente alguém que ama. É uma carta de amor ao próprio amor no seu estado mais sombrio e doloroso e, ainda, uma homenagem à nossa condição humana.

 

Gatilhos/Trigger warnings: Morte; luto; morte de um namorado; acidente automóvel; bullying.

 

Classificação: 4/5 estrelas.

 

 

Within These Wicked Walls by Lauren Blackwood
Bertrand;
Wook;
Book Depository.

 

Within These Wicked Walls, de Lauren Blackwood, é um romance de Fantasia inspirado na Etiópia e em Jane Eyre, o clássico de Charlotte Brontë. A sua protagonista, Andromeda, é uma debtera, uma exorcista contratada para limpar casas do Mau Olhado. Quando um jovem herdeiro bonito, Magnus Rochester, contrata-a, ela rapidamente percebe que não será um trabalho qualquer, com manifestações horríveis em cada esquina, e que Magnus está a esconder algo que vai para além dos treinos de Andromeda. A morte é o resultado mais provável se ela ficar, mas deixar Magnus a viver com a sua maldição sozinho não é uma opção. A maldade poderá andar pelos corredores do castelo, bem como um desejo ardente.

Gatilhos/Trigger Warnings do livro (segundo o website da autora): Sangue; "gore"; morte; imagens perturbadoras; horror corporal; abuso físico/emocional de uma figura paternal; aranhas; referências ao suicídio/ideação suicida.

 

Obrigada, Wednesday Books/St.Martin's Press e NetGalley, pelo eARC deste livro para, em troca, providenciar uma opinião honesta. Este livro foi lançado a 19 de outubro e eu deveria ter publicado a minha opinião um pouco antes dessa data, mas não foi possível. No entanto, finalmente, aqui está ela!

 

Tendo em conta o que a sinopse prometia, estava à espera de um romance obscuro, gótico e repleto de perigo e algo semelhante a magia, mas desiludiu-me um pouco devido ao foco extremo na relação amorosa entre Andromeda e Magnus.

O início foi bom. O livro começa logo com ação, mistério e a apresentação do universo de Fantasia criado pela autora. As explicações relativamente ao que debteras fazem e ao Mau Olhado deixaram-me fascinada e curiosa. No entanto, no momento em que é apresentado o interesse amoroso da protagonista, percebi logo que o livro iria afastar-se mais dessas partes interessantes. Infelizmente.

As Manifestações, ou seja, atos malvados e assombrosos provocados pelo Mau Olhado, foram sempre das melhores partes do livro. A escrita da autora brilhava nesses momentos, dando-nos imagens assustadoras, mas incríveis. Estava à espera de mais situações como as Manifestações, mas, sempre que aconteciam, surgiam e desapareciam rapidamente. Pareciam servir apenas para dar uma sensação mágica e gótica ao livro. Estes momentos apareciam para encher a história e não para fazer realmente parte da história. Não sei bem explicar. Só sei que é uma pena a autora ter dado mais atenção a uma relação amorosa estranha e que nasceu de forma rápida e sem grandes bases em detrimento do que a algo tão diferente e interessante como as Manifestações e o trabalho de debteras. Aliás, a apresentação e o desenvolvimento desse mundo de debteras e do Mau Olhado acabou por ficar pelo caminho. A certa altura, fiquei confusa quanto ao modo como as coisas funcionavam. Certas descrições de atos de debteras eram mesmo confusas e fiquei com a sensação de que havia mais por mostrar e desvendar quanto ao modo como surgiram os debteras e como essas pessoas trabalham, mas tudo foi pelo cano abaixo para dar espaço a Magnus, o interesse amoroso, e Jember, o mentor de Andromeda.

 

Imagem

Andromeda, a protagonista. Arte de Arthur Shahverdyan.
Fonte da imagem.

 

O estilo de escrita não me agarrou. Não me pareceu nada de especial, exceto nos momentos mais góticos, isto é, nas Manifestações do Mau Olhado. Aí, era uma escrita atmosférica e maravilhosa. Adorei as passagens sobre as paredes sangrentas que serviam como prisão e morte das vítimas do Mau Olhado. Sem dúvida alguma que é uma escrita suficientemente boa para nos entreter. Contudo, não me aqueceu, nem me arrefeceu.

As personagens foram pouco desenvolvidas, apesar de o elenco ser bastante pequeno. O "flirt" entre Andromeda e Magnus, por vezes, era engraçado, mas o livro ganhava mais se fosse um "flirt" amigável e não algo forçado e pouco encantador. Lá no fundo, a química não era assim tão boa. Mal se conheciam, o que me levou a estranhar as razões de certas ações, como a vontade dela em salvá-lo. Seria mesmo amor? Pena? E a vida dela? Tudo por um jovem rico mimado que acabou de a contratar para serviços extremamente perigosos e que a fazia sentir-se mal consigo mesma?
Não sei se gostei da figura paterna de Andromeda, Jember. Há muito trauma nela provocado por ele e pela sua violência, mas, ao mesmo tempo, ela gostava dele e mostrava isso. Sei que a autora provavelmente queria mostrar que todas as relações são complicadas e têm as suas nuances, mas... o homem era mesmo física e psicologicamente mau com ela. Ela gostava dele porque ele ensinou-a a ser debtera e, até certo ponto, ajudou-a nas fases complicadas da vida dela. Não será essa mensagem um pouco perigosa? "O teu parente pode ser mau e cruel, mas está tudo bem se ele te der umas coisas, for simpático contigo de vez em quando e tiver um passado complicado e triste". Eu até posso ter percebido mal as verdadeiras intenções da autora, mas foi esta a interpretação que criei em relação a estas duas personagens. Claro que, entretanto, foram apresentadas outras facetas de Jember que parecem servir para que o leitor sinta empatia e pena por ele, mas, sinceramente, eu pensava mais no seu lado mau. Acho que a maneira de ser dele e a sua história de vida não podem ser desculpas para a sua maldade. Podem ser explicações e razões, mas nunca deveriam ser desculpas. Embora ele tenha tido uma vida difícil, não consigo ignorar o mal que fez a Andromeda. Digo quase o mesmo quanto a Magnus, o interesse amoroso. Como mencionei anteriormente, não só o amor entre ambos acontece de forma muito rápida e sem bases, mas também é uma relação um pouco problemática. Magnus faz Andromeda sentir-se culpada de coisas das quais ela não tem culpa nenhuma. Ele é manipulador e julga-a imenso por querer manter uma relação paterna com Jember, mas não vê que ele próprio tem problemas para resolver quanto a outras relações que tem na sua vida. Parece que usa o "flirt", a maldição e o seu passado para manter Andromeda presa a ele.
Como veem, não gostei muito das personagens, a não ser de Andromeda e Saba, uma personagem fascinante e carinhosa, embora ela própria fizesse parte da maldição. Não posso dizer mais quanto a esta personagem para não dar spoilers, mas é uma pessoa simpática e altruísta apesar das circunstâncias. Andromeda e Saba são as únicas personagens que realmente são interessantes. As restantes, como Jember e Magnus, são mesquinhas e manipuladoras, havendo outras que, ao serem assim também, foram muito mal desenvolvidas. Não só aparecem pouco, como também mal vemos alguma coisa das suas personalidades, como é o caso do advogado de Magnus e a irmã dele, que ama Magnus e maltrata Andromeda porque a vê como um obstáculo para uma possível relação entre ela e um rapaz pouco interessante. Já nem me lembro dos seus nomes.

 

ImagemMagnus Rochester. Arte de Ciel Pierlot.
Fonte da imagem.

 

Concluindo, a sinopse de Within These Wicked Walls prometia uma história gótica com um romance avassalador, mas não foi o que eu esperava. Teria sido um livro mais interessante se fosse mais sobre o Mau Olhado e as suas Manifestações e não sobre a relação amorosa sem fundamento, pouco genuína e pouco saudável de Andromeda e Magnus. A escrita da autora não é das mais fabulosas, mas entretém e ganha vida e força nos momentos das Manifestações. As personagens têm pouco sumo e não gostei de como é dado a entender que certas relações são boas quando, na realidade, não são. Portanto, não é daqueles livros que irei aconselhar a toda a gente. Ainda assim, vou estar atenta ao que a autora irá publicar a seguir.

 

 

Classificação: 2/5 estrelas.

 

 

 

Bertrand.pt - A Imperatriz da Lua Brilhante

 

Sinopse oficial: No palácio da China imperial, uma concubina aprende rapidamente as várias técnicas para conquistar o coração do imperador, o Único acima de Todos: pintar a cara de branco, desenhar um sinal de beleza, fazer penteados elaborados… Mei é convocada aos 13 anos para a corte do palácio na China imperial, uma honra que resgatará a sua família, outrora nobre e influente, da miséria.

Porém, ela rapidamente descobre que para se aproximar do imperador e conquistar o seu coração terá de ultrapassar obstáculos perigosos. Como desconhece a arte da sedução, no dia do aniversário do imperador, Mei oferece-lhe um presente singular: uma adivinha. Porém, quando lhe parecia que estava em posição de seduzir o homem mais poderoso da China, Mei apaixona-se por Faisão, o filho mais novo do imperador. Contudo, uma tentativa de assassinato ao imperador provoca uma luta terrível pelo poder na corte imperial. E Mei terá de se servir das suas excelentes capacidades de inteligência, sabedoria e engenho para escapar e salvar o amor da sua vida.

Baseando-se em factos reais, Weina Dei Randel pinta de forma notável o quadro da China antiga, em particular da corte imperial, em que o amor, a ambição, a intriga e os jogos de poder podem determinar a vida ou a morte.

 

 

 

Este livro baseia-se numa figura da História da China, a Imperatriz Wu Zetian. Neste livro, ela chama-se Mei e é uma rapariga que nasceu numa família nobre que, devido à morte do pai, caiu na desgraça. Mei vê que as coisas podem melhorar quando é convocada para ser uma concubina do imperador. Não faltam intrigas, traições e táticas inteligentes que deixam o leitor curioso até chegar à última página. Mas será o livro sempre assim tão bom?

 

A linha narrativa não é complicada: Mei quer salvar a sua família da miséria e, por isso, ao ser convocada para ser concubina, aceita sem problemas. Aliás, ela promete a si mesma que fará tudo para estar no topo da hierarquia das concubinas, ou seja, ela pretende ser A Mais Adorada, uma posição de respeito e de alto nível que garante segurança e uma vida relativamente boa. No entanto, há problemas políticos que nada têm a ver com ela que poderão dificultar os seus planos, já para não falar que ela acaba por se apaixonar pelo filho mais novo do imperador. Posto isto, por um lado, temos Mei como uma jovem que gostaria muito de ser uma rapariga normal e livre para poder estar com quem realmente ama. Por outro lado, temos uma Mei astuta que quer ajudar a sua família e ganhar poder. Este contraste entre a ingenuidade e a pureza do amor entre Faisão e Mei e as intrigas políticas e a vida de concubina foi feito de forma interessante e tornou a história mais rica.
Desconheço a História da China, mas penso que a junção equilibrada dos factos históricos com a imaginação da autora funcionou muito bem neste livro, captando a atenção e o interesse do leitor. Realço, no entanto, que é uma leitura lenta e pode dar a sensação de que nunca mais acaba, mesmo quando os pormenores históricos e as personagens são interessantes.
A violência, a deslealdade, a desconfiança e o medo são coisas que vêm com o poder imperial e isso está muito bem explícito ao longo da história. Comentários sociais sobre o papel da mulher num mundo onde o poder é só dos homens também estão muito presentes neste livro. Devido à hierarquia das concubinas, há muita competição, raiva e inveja, mas também há espaço para a amizade e a entreajuda. Algumas são muito influentes e, de certa forma, acabam por ter o seu próprio poder, mesmo que sejam, ainda assim, dependentes e inseguras quanto à sua vida. É neste ambiente que Mei, que entra nele aos 13 anos, aprende a ser perspicaz, sedutora e inteligente. É muito interessante vê-la a desenvolver-se e a transformar-se numa mulher com potencial enquanto os homens não se apercebem disso devido aos seus próprios planos e conspirações.

 

 

MooninthePalaceCapa da edição dos EUA.

 

A criação de personagens complexas que se desenvolvem ao longo da história é, assim, um ponto forte e positivo de Weina Dai Randel. São personagens credíveis com atitudes e pensamentos expectáveis tendo em conta a situação de cada um. São, por isso, personagens muito humanas. São figuras que compõem um elenco muito diversificado em termos de objetivos e maneiras de ser. Existem pessoas honestas e simpáticas, pessoas mentirosas e egoístas, pessoas ingénuas e tontas. Estas personagens, quer as que têm objetivos políticos, quer as que apenas querem sobreviver, fazem com que este romance seja cativante.
Apesar disso, penso que a relação amorosa entre Mei e Faisão deveria ter sido mais desenvolvida. A pureza do amor deles é palpável, mas não suficientemente encantadora.


Por fim, relativamente à escrita, esta não é floreada, mas sim clara e precisa, não sendo aborrecida ou menos fascinante. As descrições da vida na corte imperial são equilibradas e visuais. Entra-se facilmente no cenário graças às descrições das roupas, das tradições, dos eventos e da arquitetura do palácio. Digo que são equilibradas porque não tornam o livro enfadonho e, pelo contrário, enriquecem-no. A escrita também mostra o trabalho que a autora teve na sua pesquisa histórica e como ela conseguiu transformar essa pesquisa num romance histórico intrigante e não num livro de ficção que se parece mais com um manual escolar com um pouco de imaginação.

 

 

https://www.weinarandel.com/wp-content/uploads/2016/03/Thai-Empress.jpgCapa da edição da Tailândia.

 

Em suma, A Imperatriz da Lua Brilhante é fascinante graças às descrições cinematográficas e envolventes sobre a vida na corte imperial chinesa (desde as roupas até aos espaços do palácio) e às personagens muito humanas e complexas. Acrescenta-se, ainda, o talento da autora em escrever um romance histórico que não se pareça com uma aula de História. É pena o facto de a relação entre Mei e Faisão ter aparecido rapidamente e não ter tido grande desenvolvimento. O livro também pode parecer maçudo devido às constantes conspirações e momentos da vida palaciana um pouco repetitivos. Ainda assim, é uma leitura interessante.

 

Classificação: 4/5 estrelas.

 

 

Tunnel of Bones (City of Ghosts #2)Capa da edição britânica.

 

Tunnel of Bones, de Victoria Schwab, é o segundo livro da trilogia infantojuvenil sobrenatural Cassidy Blake. Desta vez, Cassidy e o seu melhor amigo fantasma, Jacob, estão em Paris, onde os pais dela estão a filmar para o seu programa sobre as cidades mais assombradas do mundo. Claro que é divertido comer croissants e ver a Torre Eiffel, mas há verdadeiros perigos fantasmagóricos debaixo de Paris, nas arrepiantes Catacumbas. Quando Cass acidentalmente acorda um espírito forte, ela deve usar as suas habilidades de caçadora de fantasmas (ainda a desenvolverem-se) e pedir ajuda a velhos e novos amigos para desvendar um mistério. Mas o tempo está a esgotar-se e o espírito está a ficar cada vez mais forte.
Se Cass falhar, a força que ela libertou poderá assombrar a cidade para sempre.

 

Mais uma vez, Schwab maravilha-nos com uma história fantasmagórica sobre amizade, resiliência e a importância de continuar a lutar apesar de todos os obstáculos. Desta vez, o cenário é Paris e, de facto, a autora sabe transportar-nos até lá com as suas descrições cinematográficas e referências à comida francesa e aos grandes símbolos da capital francesa. A sua escrita continua a ser fascinante, mas será que gostei deste livro tanto quanto gostei do primeiro?

 

Tunnel of Bones (City of Ghosts #2), 2Capa da edição dos EUA.

 

Tal como no primeiro livro, é muito fácil acompanhar o enredo deste segundo capítulo. Mais uma vez, Cassidy e as restantes personagens vão para um sítio por causa das filmagens de um programa sobre o sobrenatural. Vão para Paris, onde ficam maravilhados com a sua beleza e História, principalmente com as Catacumbas. No entanto, sem querer, Cassidy acorda um espírito e, assim, ela percebe logo que tem mais uma batalha a travar, ao lado de Jacob e outras pessoas. A linha narrativa é, portanto, simples, deixando-nos, na mesma, curiosos sempre que viramos a página. Além disso, a sua simplicidade torna este livro numa leitura rápida e prazerosa. Ainda assim, gosto mais do primeiro livro do que do segundo. Penso que o vilão do primeiro era mais cativante e assustador do que o do segundo livro. Todavia, Tunnel of Bones, ao contrário de City of Ghosts, é mais focado nos sentimentos, medos e receios das personagens, bem como na presença constante da morte e na vida de Jacob antes de ser um fantasma. Neste livro, Cassidy reflete mais sobre como, um dia, Jacob terá de desaparecer para sempre, tendo em conta que é um fantasma que está há demasiado tempo no mundo dos vivos. Ela até sonha que ele irá transformar-se num poltergeist, um tipo de fantasma que gosta de caos, e ela não quer isso para o seu amigo. Ou a amizade acaba um dia, ou, então, ela terá de usar os seus conhecimentos como caçadora de fantasmas contra o amigo.

 

As personagens, deste modo, ganham mais vida neste livro, principalmente Jacob. Pode ser um fantasma, mas este livro dá-nos mais detalhes sobre a vida dele antes de falecer, passando a ser uma personagem mais ativa e presente, tendo em conta que era apenas um braço direito engraçado de Cassidy no primeiro livro, e não uma personagem com uma personalidade mais vincada e única.
As dinâmicas entre as personagens são sempre um dos pontos fortes de Schwab. Ela é sempre capaz de criar relações cativantes e autênticas entre personagens. Neste caso, é muito curioso ver Cassidy lidar com os seus novos conhecimentos enquanto uma caçadora de fantasmas que, ao mesmo tempo, tem um amigo fantasma. Lara, uma personagem do primeiro livro, reaparece nesta história como a enciclopédia do mundo dos caçadores e dos fantasmas e é bom ver a inclusão da tecnologia como uma grande ajuda na missão, isto é, já basta de histórias infantojuvenis onde a tecnologia é sempre vista como uma inimiga ou algo mesmo muito mau.
Neste segundo volume, aparece mais uma criança que quer ajudar Cassidy e Jacob, Adele Laurent. Ela estava simplesmente aborrecida e juntou-se aos dois jovens para descobrir a identidade do poltergeist. Parece-me que Adele representa todos os leitores que leem precisamente para terem as suas aventuras e uma vida fora da vida dita normal.

Não posso terminar esta opinião sem mencionar o estilo de escrita de Schwab. Mais uma vez, de forma brilhantemente cinematográfica, ela faz-nos viajar pelos locais que as personagens visitam. Melhor do que isso, ela sabe muito bem como criar um ambiente atmosférico e sombrio, ideal para um livro sobrenatural como este. É uma escrita deliciosa e, como dizem em inglês, spooky.

 

Cassidy Blake - tome 2 Plongée dans les catacombes (2) (French Edition):  Schwab, Victoria, Dali, Sarah: 9782371022898: Amazon.com: BooksCapa da edição francesa.

 

Em suma, Victoria Schwab está de parabéns por ter escrito mais um livro infantojuvenil sobrenatural sensacional e cativante. Gostei muito mais do primeiro, mas Tunnel of Bones mantém o estilo de escrita fenomenal, atmosférico e visual de Schwab e uma linha narrativa interessante que proporciona uma leitura rápida e agradável. Além disso, as personagens estão mais desenvolvidas nesta história, passaram por aventuras incríveis e fizeram novas descobertas, deixando o leitor mais curioso em relação ao terceiro livro. Recomendo a leitura deste livro, bem como do anterior!

 

Para lerem a minha opinião sobre o primeiro livro, cliquem aqui.

 

Classificação: 4/5 estrelas.

 

P.S.: O Grupo Almedina, que já publicou quatro livros de Victoria/V.E. Schwab, confirmou que irá publicar mais livros da autora em 2022. Será que irão, pelo menos, publicar City of Ghosts? Veremos!

 

Até breve!

 

 

Frankly in Love | Amazon.com.br

 

P.S.: Esta opinião contém spoilers. Se ainda não leram o livro, passem para o próximo parágrafo depois de verem a palavra spoilers assim: SPOILERS.

 

Frankly in Love, de David Yoon, é um romance contemporâneo YA sobre um rapaz coreano-americano, Frank,  que quer namorar com uma rapariga branca, mas os seus pais querem que ele namore com alguém que também seja de ascendência coreana. Deste modo, ele faz um pacto com uma amiga coreano-americana, Joy, cujos pais são como os pais dele. Só que nenhum dos jovens pensava que o amor iria crescer entre eles...

 

Apesar de a minha própria sinopse estar focada na vida amorosa do protagonista, na realidade, o amor não é exatamente o grande tema do romance. Este livro, de forma muito direta, explora o racismo, a xenofobia, o "anti-blackness" na comunidade coreana, entre muitos outros assuntos sociais. É, portanto, um livro carregado de mensagens sociais, mas também de sentimentos e experiências típicas da adolescência.

 

O enredo é muito simples: Frank é coreano-americano e os seus pais querem muito que ele namore com alguém como ele. No entanto, ele está apaixonado por uma rapariga branca. Entretanto, uma amiga dele, Joy Song, que também é coreano-americana, tem o mesmo problema. Assim, eles fazem um pacto: perante os pais, eles fingem ser namorados. Fora das suas casas e dos seus meios familiares, eles estão com os seus respetivos pares. Era suposto ser um plano simples, mas, depois, os sentimentos mudam...
Ao longo da história, não vemos tanto sobre esta parte da vida de Frank. Vemos, sim, Frank a explorar questões como a dualidade da sua identidade e o facto de ele não gostar da forma de pensar dos pais. Frank está sempre a falar sobre racismo, xenofobia, as diferenças entre a sua geração e a geração dos pais e as relações familiares complexas. É interessante ver como o autor alude imensas vezes o racismo que existe entre pessoas da comunidade coreana em relação aos que não são coreanos, principalmente relativamente a pessoas negras. Por exemplo, a irmã de Frank namora com um homem negro e os pais não aceitam o relacionamento.
Posto isto, é um romance contemporâneo YA que explora mais as temáticas importantes e atuais como as que foram mencionadas do que Frank e os seus amigos como adolescentes.
O problema nisto é que muitos leitores, eu inclusive, pensavam que iria ser um livro amoroso com linhas narrativas que muitos adoram, como o triângulo amoroso e o namoro falso. Ao verem que, afinal, esses aspetos narrativos não existem numa grande escala, acabaram por não gostar muito do livro e sentiram-se enganados. De facto, a editora deveria ter tido mais cuidado quanto à sinopse e às próprias estratégias de marketing, que apresentavam em grande destaque a situação do triângulo amoroso. Outras pessoas, mesmo depois de perceberem que o amor não era o grande tópico da história, acabaram por, pelo menos, gostar do livro na mesma devido à forma como o protagonista está atento ao mundo que o rodeia.
No meu caso, acho que a abordagem dos temas e o triângulo amoroso deveriam existir nas mesmas medidas, uma vez que... As relações amorosas não eram genuínas e não faziam grande sentido. Não foram desenvolvidas ao ponto de serem algo, pelo menos, realista. Frank gosta de Brit, a rapariga branca, porque.... é bonita. Não há muito mais para além disso. Devido ao namoro falso, ele acaba por não estar muito com Brit e os seus sentimentos por ela não são mais do que atração física e não crescem. Quanto a Joy... Foi tudo muito repentino. Durante o namoro falso, viram que tinham muitas coisas em comum e divertiam-se imenso juntos e... pronto... Apaixonaram-se e, SPOILERS, deram início a uma relação verdadeira, traindo os seus respetivos pares, o que é horrível. Eu odeio histórias que parecem validar a traição e esta parte da história foi, para mim, uma das piores partes do livro.

 

FILFonte.

 

Quanto à escrita, não sei se gostei do estilo de Yoon. Houve momentos em que achei a escrita um pouco pretensiosa. O pior são certas piadas que... não têm piada. Não me lembro de exemplos concretos, mas há coisas muito estranhas e esquisitas ao longo do livro. Alguns leitores disseram que o autor tentou ser peculiar como John Green e consigo ver a lógica nesse argumento. Green ficou conhecido por ter personagens ímpares que se acham muito filosóficas e especiais em relação aos meros mortais que não passam a vida a dizer citações memorizadas. Yoon pareceu querer criar um estilo também peculiar e ímpar, mas... Acabou por ser um estilo apenas estranho. Talvez a melhor parte da sua escrita seja a forma como incluiu os temas sociais acima referidos e os momentos que destacam a cultura coreana e as suas tradições. Os mesmo foram abordados de forma simples, mas eficaz.

 

Relativamente às personagens... Parto já para a melhor parte: Frank e os pais. No início, Frank revolta-se muito, especialmente interiormente e não propriamente à frente dos pais, contra a maneira de pensar deles. Entretanto, ele vai percebendo as razões pelas quais eles têm os preconceitos que têm. Ele não aceita, claro, mas começa a compreender as suas opiniões e maneiras de ser e quer melhorar a sua relação com eles. De resto...
Primeiro, como já disse, a ligação entre ele e Brit é nada mais do que algo físico. Não há mais nada ali. Nada. Por causa disso, Brit não passa de uma menina bonita. Ela não tem personalidade. É como se ela existisse apenas devido à sua beleza e por ser um desafio aos ideais dos pais de Frank. Depois, Joy... Nem deu para perceber como surgiram os sentimentos supostamente genuínos entre eles. Pelos vistos, devido às semelhanças que partilhavam enquanto coreano-americanos, Frank de repente percebeu que gostava dela. Joy, que tinha um namorado, foi na onda de Frank e começaram a namorar. Joy também não é muito diferente de Brit relativamente a personalidades. Há poucas diferenças, como o facto de Joy ser um pouco mais rebelde, "boa onda" e... Não sei mais o que dizer, sinceramente. É interessante ver como, mais uma vez, a personalidade de uma personagem feminina não foi bem desenvolvida.
Quanto a Frank, é muito difícil gostar dele. Por vezes, o seu humor e o sarcasmo são bons, mas eram mais vezes estranhos do que bons. Ele critica os pais por julgarem aqueles que não são como eles, mas Frank não é muito diferente deles ao estar constantemente contra a geração anterior. É perfeitamente válido criticar a geração dos pais e ele faz críticas muito boas, mas ele próprio é preconceituoso. Depois, há o facto de ele não querer saber de nada que seja mais complexo e profundo relativamente a raparigas e relações amorosas. Portanto, não sei se gostei dele. As críticas sociais e o facto de estar atento à sociedade em que está inserido devem ser os aspetos mais positivos desta personagem.
Por último, gostaria de falar sobre Q, mas tenho de avisar que há SPOILERS a seguir. Q, um rapaz negro, é o melhor amigo de Frank. É com ele que Frank fala sobre a sociedade e raparigas. Também jogam jogos e fazem outras coisas do género. E é isto. Não há muito mais. No entanto, queria falar sobre ele porque o autor achou por bem usá-lo como um plot twist: Q é gay, ama Frank e beija-o nas últimas páginas. Acho que não é nada bom quando um autor deixa cair de paraquedas uma personagem gay só para tornar o protagonista na melhor pessoa de sempre ou para fazer com que o livro seja um pouco mais diversificado. Uma personagem secundária gay não deve existir para enaltecer o protagonista ou o próprio livro. Se é para incluir uma personagem gay, a mesma deve existir como um todo, como uma pessoa autêntica, não como um meio para atingir um fim.

 

 

14 people who weren't prepared for the Frankly in Love trailer - Penguin  TeenImagem do book trailer.
Fonte.

 

Concluindo, é engraçado como, no final da leitura, eu não tinha tantos apontamentos negativos relativamente a Frankly in Love. Eu até tinha gostado da experiência de leitura. Mas há mesmo mais aspetos negativos do que positivos. Sim, continuo a gostar de como o autor falou sobre o racismo, a xenofobia, a diáspora, famílias complexas, etc. Também há momentos divertidos. No entanto, a sua escrita um pouco pretensiosa, as suas personagens com personalidades pouco desenvolvidas ou inexistentes e o enredo simples, mas pouco satisfatório em comparação ao que era prometido pela sinopse são aspetos que devem ser apontados.

 


Classificação: 3/5 estrelas (mas 3 estrelas fracas).

 

 

https://m.media-amazon.com/images/I/41FOQSq1xhL.jpg

 

P.S.: A autora enviou-me gratuitamente um documento PDF de Cinderel em troca de uma opinião honesta e divulgação.

 

Em Cinderel - Da Cinza ao Cristal, de R. C. Montenegro, "Cinderel, alcunhado Borralho, é maltratado pela madastra e os seus filhos e procura nas festas e nas máscaras um escape do seu dia-a-dia entre as cinzas das lareiras. Apenas não imaginou que chamaria a atenção do facilmente espicaçável Bernardo, e muito menos que, ao troçá-lo, troçava o seu príncipe".

 

Este reconto queer da história da Cinderela pode ter apenas 82 páginas, mas são páginas recheadas de amor, sensualidade e resiliência, já para não falar das bonitas descrições cinematográficas dos cenários.

 

Adoro como o enredo tem características do filme da Disney, como a beleza dos cenários e a sumptuosidade dos eventos sociais, bem como a importância dada ao vestuário e, claro, aos sapatos especiais. Mas Cinderel também tem uma certa dose de violência como na história terrível, mas original, da Cinderela, onde as irmãs são severamente castigadas, por exemplo. E mais não digo, pois têm de ler este livro para verem como é que os irmãos, neste caso, sofrem as consequências dos seus atos, bem como a madrasta.
Ao contrário do filme da Disney, que é muito fraco em relação à demonstração dos sentimentos amorosos, esta história tem imensos momentos amorosos, incluindo cenas sexuais, que mostram claramente a paixão, o amor e o carinho que ambos sentem um pelo outro.
Um outro aspeto positivo relativamente ao enredo é o facto de ser, realmente, um reconto da Cinderela, mas a autora soube enriquecer a sua própria história ao acrescentar cenas e personagens que não existem nem na versão da Disney, nem na versão original. Por isso, à medida que lemos, não sentimos aborrecimento ou ficamos a pensar como esta pequena história é uma cópia dessas famosas versões. Não, não tem nada a ver com elas e, de facto, tornou a história mais forte e completa.

 

A escrita de Montenegro é simples e eficaz, principalmente quanto às descrições, que não são nem muito detalhadas, nem pobres em elementos. Têm a dose certa para que possamos visualizar os cenários e as festas. Além disso, transmite muito bem os sentimentos e as opiniões das personagens, não perdendo tempo com longos monólogos e coisas do género. Em termos de edição, existem algumas falhas, mas não estragam o talento da autora.

 

Por fim, em relação às personagens, penso que Cinderel é a personagem mais completa e interessante da história. A sua triste história de vida, a sua resiliência e, claro, o seu atrevimento fazem com que queiramos apoiá-lo até ao fim. Bernardo não me pareceu ser tão bem desenvolvido, mas a química entre ele e Cinderel é palpável e autêntica. Teria sido interessante ver mais da madrasta e dos seus filhos. Uma presença maior destas figuras poderia tornar a história ainda mais rica. Ainda assim, gostei deste elenco.

 

Concluindo, Cinderel - Da Cinza ao Cristal, de R. C. Montenegro, é a prova de que não falta talento em Portugal. O enredo é forte e está bem elaborado, a escrita é fluida e muito visual, e as personagens, embora precisassem de um pouco mais de trabalho, são interessantes, principalmente Cinderel. Seria bom ver as editoras tradicionais mais atentas ao que anda a ser feito por aí e aos autores mais jovens. Ainda bem que Montenegro se aventurou na edição independente e nos proporcionou uma linda história de amor entre dois rapazes que querem ser felizes para sempre.

 

Classificação: 4/5 estrelas.

 

Ficaram interessados no livro? Gostariam de ler esta história maravilhosa? Cliquem aqui para terem todas as informações.

 

 

Bertrand.pt - Sadie

 

Gatilhos/Trigger warnings: Abandono; morte; depressão; drogas; família disfuncional; perda de um membro da família; homicídio; pedofilia; violação; abuso sexual de uma criança; violência.

 

Sadie, de Courtney Summers, é um thriller jovem-adulto sobre Sadie Hunter, de 19 anos, que desapareceu em busca de vingança. À medida que seguimos as suas pisadas, também "ouvimos" West McCray, um radialista que tem um podcast sobre true crime e foi contactado por uma desconhecida para localizar Sadie. No início, West não valorizou muito a situação, mas o desaparecimento de Sadie, afinal, tem aspetos insólitos.

Primeiro, não era uma fugitiva qualquer. Tem gaguez, foi abandonada pela mãe e viu o seu mundo desmoronar quando a irmã mais nova foi brutalmente assassinada. A polícia é incapaz de encontrar o culpado. Terá Sadie ido à procura de justiça?

West acaba por ficar obcecado com o caso e dedica todo o seu tempo ao desaparecimento de Sadie, indo até à cidade natal da jovem para seguir o seu rasto. O que ele não esperava era que cada pista resultasse numa verdade absolutamente chocante....

 

 

Uma leitura inquietante e viciante do princípio ao fim! Violência (sexual, física, etc.) contra raparigas e mulheres. Este é um dos grandes temas deste livro. E que forma de abordar o mesmo! O livro foi tão realista e certeiro sobre como este caso seria tratado se fosse real. A falta de entreajuda e de interesse, um sistema judicial injusto e ora demasiado despachado, ora demasiado lento, a rapidez com que um caso passa de urgente para nada... É, portanto, uma leitura revoltante, mas que nos prende pelo magnífico retrato social e judicial real.

 

Comecemos pelo enredo. É de fácil compreensão e de se acompanhar. Às vezes, quando temos mais do que uma perspetiva ou um narrador, pode ser complicado ou confuso. Neste caso, isso não acontece, pois, por um lado, temos a protagonista e a sua demanda. Por outro lado, temos um radialista a investigar essa mesma demanda, mas através do seu podcast, que inclui entrevistas, telefonemas e transcrições de conversas. Portanto, estamos a falar de formas completamente diferentes de termos perspetivas igualmente diferentes. Isso foi uma técnica genial e faz com que o leitor fique preso à história, uma vez que está a seguir os passos de Sadie e está a criar as suas próprias opiniões e teorias. Ao mesmo tempo, temos o radialista, que, tal como o leitor, está a criar as suas opiniões e teorias. É mesmo extraordinário ver como o enredo acaba por se desenvolver tão bem e sem emaranhados através destes dois formatos diferentes.

Além disso, o enredo é forte e um grande soco na barriga emocional. É tudo apresentado de forma simples e o menos explícito possível, mas dá para perceber que é uma história sobre crimes sexuais, como pedofilia e abuso sexual, e morte. É pesado, é revoltante e, infelizmente, é como tantos crimes e situações da vida real. No desenrolar da ação, é impossível não sentir a fúria e a frustração de Sadie. É tudo tão cru e cruel, que o leitor acaba por sentir na sua própria pele e no seu próprio coração as emoções da protagonista e a inquietação crescente de West. É, deste modo, uma história de leitura fácil e rápida, mas dura e difícil de digerir pelos temas retratados, não sendo, no entanto, péssima por isso. Aliás, a grande mestria de Summers está no facto de ela ter um enredo pesado e uma escrita simples.

 


m o r e t h a n w o r d s — books i've read in 2019 » Sadie by Courtney...Fonte da imagem.

 

 

Por falar em escrita, esta é também direta, sem rodeios e paragens. A autora está sempre a dar mais e mais do seu talento e o leitor absorve tudo. Admira-me imenso como Summers foi capaz de contar uma história tão violenta de uma maneira tão simples e sem violência gratuita. Tudo tem um propósito. Nada serve para chocar o leitor só porque sim. O choque existe porque tudo o que é contado é real. Esta história em específico é fictícia, mas é baseada no mundo em que vivemos. É claro que choca, mas não é um susto barato como vemos em filmes de terror com crítica social péssimos. Summers foi brilhante em não ser sensacionalista. Fez tudo com humildade e respeito para com as verdadeiras vítimas. É uma escrita muito humana. De um ponto de vista literário, como disse acima, é simples, direta e cativante, não perdendo tempo com sensacionalismos e choques que não são sinceros.

 

Quanto às personagens, as que têm grande peso e mais presença são, claro, Sadie e West. As personagens secundárias são as migalhas do trilho dos crimes e, apesar de não haver nenhuma que se destaque realmente, o propósito delas é mesmo esse: não é suposto as personagens secundárias terem as suas próprias personalidades como Sadie e West. As secundárias servem como generalizações de tipos de pessoas que se envolvem em casos como este na vida real. Temos polícias e investigadores desinteressados, pessoas comuns que nem sequer querem perder tempo a responder a uma pergunta, pessoas que se aproveitam da solidão de uma rapariga, uma sociedade que não quer saber de desaparecimentos e mortes de raparigas pobres e desinteressantes. Essa também é uma grande questão do livro: como pode a sociedade querer saber tanto sobre a morte de uma criança, mas não de uma outra? Há recursos internacionais para uma Maddie, mas nem sequer há recursos locais para uma menina pobre e sem familiares como a irmã de Saddie. Essa menina pode não ser real, mas a sua situação é. Faço novamente a pergunta: como podemos, enquanto sociedade, estarmos ligados à televisão por causa de uma criança, mas desviamos o olhar quanto a uma outra?

Sadie é impulsiva, imprudente e vingativa, mas também continua a ser uma jovem. Ainda mal atingiu a idade adulta e passou a vida em sofrimento. A mãe, viciada em drogas e álcool, abandonou Sadie e a irmã, que acabaram por viver num parque de RVs sob a visão de uma vizinha. Sadie é olhada de lado devido à sua gaguez. Sempre teve de ser a adulta da casa. É possível o leitor sentir alguma irritação perante certas atitudes dela, mas será impossível não compreender os motivos? Será impossível sentir compaixão e compreender como deve ser difícil e perigoso fazer o que ela está a fazer, isto é, ir atrás do desgraçado que tornou a vida dela num inferno ao tirar-lhe a irmã da sua vida para sempre? Esta personagem complexa é fascinante e é um outro motivo que nos faz sentir presos às páginas deste livro assombroso.

West talvez sirva como uma amostra daqueles que acabam por valorizar o que a restante sociedade despreza e ignora. É preciso ter um coração sensível para deixar de pensar apenas no seu podcast e passar realmente à ação e fazer algo por duas raparigas que, até então, tinham sido invisíveis. É incrível pensar que, nos dias de hoje, o mais provável é que ele iria acompanhar tudo e fazer a investigação só mesmo para ganhar algo com isso. Mais ouvintes, mais dinheiro, mais fama. Contudo, ele realmente é um homem preocupado. Representa também aqueles que estão fartos, mas pouco surpreendidos com a maneira como a sociedade e o sistema judicial encaram crimes como estes. Ele representa aqueles que lutam contra a indiferença, a falta de profissionalismo e de interesse, e que têm como propósito genuíno entender o que se passa e tentar resolver a situação.

 

 

Fonte da imagem.

 

 

Em suma, Sadie é um thriller jovem-adulto. Alguns devem pensar: "bem, não deve ser um thriller muito bom, até porque foi escrito para os mais jovens". Não é por ser para os mais jovens que o livro não funciona como thriller. Aliás, funciona e muito bem. É um thriller cruel e cru sem ser necessário usar descrições violentas e chocantes para captar a atenção do leitor e fazer com que o leitor sinta alguma coisa, como revolta, angústia, dor e um pouco de esperança. Este livro é bom para os que acreditam que a literatura YA não presta e que é leitura de praia, leitura simplória para jovens que passam a vida no telemóvel e mais blah blah blah. A escrita é simples, mas precisa e genuína, o enredo é complexo e duro, mas de fácil compreensão e um retrato implacável dos nossos tempos, as personagens são realistas e foram criadas com muito cuidado e talento.

No fim, e só mesmo para perceberem o quão real, profundo e doloroso este livro é, o radialista diz: "Porque eu não aguento outra rapariga morta".

E então? Ainda acham que YA é simplório?

 

Classificação: 5/5 estrelas.

 

 

Até à próxima!

 

https://img.bertrand.pt/images/wicked-fox-kat-cho/NDV8MjM5NTQ3MzJ8MTk5ODgzODB8MTYwMzQ5NDAwMDAwMHx3ZWJw/300x
 Bertrand;
Wook.

 

Wicked Fox é o primeiro livro de uma duologia de Fantasia Urbana/Paranormal jovem-adulta de Kat Cho. É inspirada na mitologia coreana, mais especificamente nas figuras de gumiho, goblin, e outras. 

Neste primeiro volume, Gu Miyoung, uma rapariga de 18 anos, tem um segredo: ela é uma gumiho, uma raposa com nove caudas que devora a energia de homens para poder sobreviver. Como são poucas as pessoas que acreditam nas velhas histórias atualmente e há muitos homens maus dos quais ninguém terá saudades, a moderna cidade de Seoul é o lugar perfeito para se esconder e caçar.

Mas depois de se alimentar numa lua cheia, Miyoung cruza-se com Jihoon, um rapaz humano que está a ser atacado por um goblin na floresta. Ela quebra as regras de sobrevivência para salvar o rapaz e acaba por perder a sua pérola de raposa, a sua alma de gumiho.

Jihoon sabe que Miyoung é mais do que uma rapariga bonita, pois viu as caudas dela na noite em que foi salvo por ela. A sua avó costumava contar-lhe histórias sobre gumihos e os seus poderes e o perigo que eram para os homens. Ele sente-se atraído por ela de qualquer forma.

Com forças mortíferas no fundo, Miyoung e Jihoon desenvolvem uma amizade ténue que acaba por ser algo mais. Mas quando um jovem shaman tenta reunir Miyoung à sua pérola, as consequências são desastrosas e reacendem uma contenda que existe há gerações.

Miyoung vê-se forçada a escolher entre a sua vida imortal e a vida de Jihoon.


Se gostas de kdramas, mitologias e Fantasia Urbana, este livro pode ser perfeito para ti. Tem imensos ingredientes em comum com muitas séries coreanas (relação amorosa, amizades interessantes, suspense, mistério, muitas emoções mistas) e a mistura de aspetos da mitologia coreana com o quotidiano normal faz-nos sentir como se tudo fosse real ou como se estivéssemos na história também. Nota-se a paixão e o carinho que a autora tem pela mitologia e pela cidade.

 

A maneira como a ação se desenrola, sem rodeios e com explicações simples e breves, torna a leitura prazerosa e viciante. Primeiro, temos as dificuldades pelas quais as personagens passam (Miyoung perde a sua pérola de gumiho e Jihoon não percebe como lidar com todo um mundo novo e está sempre perto dela). Depois, vemos relações amorosas e familiares a abrirem-se mais e a tornarem-se mais complexas, desde a ligação carinhosa entre Jihoon e a avó até à relação tempestuosa de Miyoung com a sua mãe, que é uma gumiho fria e calculista. À medida que nos aproximamos cada vez mais dos pontos altos da ação, ficamos cada vez mais fascinados e com o coração nas mãos. Há traições, mortes e desespero. O enredo termina com uma mensagem mista de esperança e de dor, sendo, portanto, uma das melhores montanhas-russas que já experienciei enquanto leitora.

 

An illustration of a Korean girl/gumiho (fox spirit) with long hair, tails behind her, with a bright full moon behind her.
Fanart de Miyoung feita por cw.

 

A escrita de Kat Cho é simples e encantadora, no sentido em que nos cativa facilmente, deixando-nos colados à história. Cho soube escolher as palavras certas e os momentos ideais para mostrar as personagens tal como elas são. Cho também soube manter o suspense e fazer os leitores sentir à flor da pele as mesmas emoções que as personagens sentiam. Nem todos os escritores são capazes de serem tão eficazes e talentosos relativamente à colocação do leitor na história, isto é, Cho fez um excelente trabalho em criar personagens credíveis que o leitor irá querer apoiar e um cenário encantador, misterioso e fascinante ao ponto de nós querermos ser transportados para dentro desse mesmo mundo.


As personagens, como indiquei acima, são realistas e um pouco diferentes em relação às personagens que estamos habituados a ver em romances Young Adult. Os defeitos são um grande destaque neste livro, mas são também um grande ponto forte desta história, pois tornam as personagens mais reais. Nem todas as personagens têm de ser perfeitas e capazes de resolver tudo num instante. Afinal, os seres humanos não são assim. As personagens de Wicked Fox são das mais realistas dos últimos livros YA que tenho lido. Miyoung é uma rapariga bonita e poderosa, mas também é teimosa e muito dona de si. Por ser rapariga, poderão dizer imediatamente que ela é complicada e má. No entanto, diriam o mesmo se Jihoon tivesse esses traços? Muitos leitores aceitam facilmente os bad boys, mas abominam personagens femininas como Miyoung. Por mim, adorei Miyoung. Precisamos de mais personagens femininas como ela. Assertivas, fortes e, sim, donas de si. Jihoon é o oposto dela, sendo mais adorável, simpático e brando, não tendo receio nenhum em mostrar a sua curiosidade em relação a Miyoung. Também acho que é raro vermos personagens masculinas mostrarem de forma decente e carinhosa e com respeito o que acham acerca das raparigas, ou seja, é bom também termos personagens como ele. Uma outra personagem surpreendente é a mãe de Miyoung, Yena. Como disse, é fria e calculista, mas não se pode dizer que é uma autêntica vilã. Há mais no coração dela. Já as amizades florescem neste livro, mas fortalecem e crescem no segundo livro, que li há pouco tempo.

 

Cartões de Jihoon, Miyoung e Yena feitos por Alexis Castellanos

 

Neste livro que lida com temas como a família, a confiança, a lealdade e a crença em nós próprios, podem esperar também por romance, ação, emoções fortes, quer negativas, quer positivas, e figuras míticas incríveis. Aconselho a leitura deste romance YA.



Classificação: 4.5/5 estrelas.